Boa leitura!

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

A REVOLTA DO MARINHEIRO JOÃO CÂNDIDO - 1910


Em novembro de 1910, quando Presidente da República o Marechal Hermes da Fonseca, uma parte da Marinha de Guerra sublevou-se, sob as ordens do Marinheiro João Cândido.

Os revoltosos dominaram por alguns dias a Baía de Guanabara e as instalações do porto do Rio de Janeiro, ameaçando bombardear a antiga Capital Federal.

Esse movimento rebelde passou à História como a Revolta do Marinheiro João Cândido ou a Revolta da Chibata, porque dentro das exigências que os marujos amotinados faziam, a principal era a abolição do castigo corporal que sofriam pelas transgressões disciplinares.
João Cândido, minutos antes da meia-noite de 22 de novembro, assumiu o comando do Encouraçado Minas Gerais, depois de, com seus homens, dominar o Oficial-de-quarto, o Segundo Tenente Álvaro da Mota e Silva, ferido gravemente com golpes de baioneta.

O Comandante do Encouraçado Minas Gerais, Capitão-de-Mar-e-Guerra João Batista das Neves – cuja chegada ao navio desencadearia a, rebelião vindo de um banquete realizado a bordo do Cruzador francês Duguay Trouin, procurando dominar a guarnição amotinada, lutou bravamente ao lado de alguns oficiais, morrendo a golpes de baioneta, juntamente com os Capitães-Tenentes José Cláudio da Silva Junior e Mario Carlos Lahmeyer.

Imediatamente, João Cândido intimou os Encouraçados São Paulo e Deodoro, que aderiram à causa sob a ameaça dos canhões do Minas Gerais; da guarnição do Encouraçado São Paulo, morreu o Primeiro Tenente Américo Sales Carvalho que reagiu frente aos amotinados.

A bordo do Cruzador Bahia, onde fermentaram os primeiros germes da insurreição, os revoltosos intimaram o Oficial-de-quarto, Primeiro Tenente Mario Alves de Souza, a abandonar o navio. Sozinho, não atendeu à intimação, sustentando luta contra mais de cem homens armados. Subjugado, o Bahia, sob o comando do Marinheiro de Primeira classe Francisco Dias Martins, assestou seus canhões contra a Capital; a guarnição rebelada exigia a abolição dos castigos corporais, a diminuição do trabalho e o aumento de vencimentos.

Depois de muito parlamentar, o governo do Marechal Hermes da Fonseca atendeu, por Decreto, às reivindicações, concedendo também a anistia.

Os espíritos serenaram somente a 9 de dezembro daquele ano de 1910, quando o Batalhão Naval da Ilha das Cobras e o Cruzador Rio Grande do Sul foram dominados.

A marujada sediciosa ameaçou o porto paulista de Santos, tendo o Chefe da Nação requisitado o concurso do governo de São Paulo, para frustrar qualquer tentativa de desembarque.

O Chefe do Executivo Bandeirante determinou ao Comando da Força Pública que fizesse seguir, já no primeiro dia da Revolta, àquela cidade litorânea, o 1.º Batalhão com a missão de barrar, a qualquer custo, as intenções dos sublevados.

O comandante do Batalhão, Tenente-Coronel Pedro Árbues Rodrigues Xavier (que na Revolução de 1930, seria o herói-mártir de Cananeia), foi nomeado Comandante Militar da Praça de Santos naqueles dias tumultuosos.

Regressou o Primeiro Batalhão depois de bem cumprida sua missão, pois escreveu mais uma página de glória nos anais do militarismo paulista, na defesa do Poder Constituído da Nação e do Estado.

Quanto ao Almirante Negro, o Marinheiro João Cândido, serenados os ânimos veio, poucos dias depois da anistia, a traição. Ele foi expulso da Marinha, junto com os líderes da Revolta, o que ocasionou reação entre os marinheiros mas, o movimento foi abortado, sofrendo os homens do mar violenta repressão, que culminou com dezenas de mortos e feridos e centenas de deportações. João Cândido foi novamente encarcerado com 18 companheiros, numa masmorra na Ilha das Cobras, de onde foi o único a sair vivo. Faleceu em 1969, aos 89 anos, de idade sem patente e na completa miséria. Há um movimento nacionalista, para inscrever o seu nome no livro dos heróis da Pátria.
                            


quarta-feira, 5 de novembro de 2014

MEU CAPOTE SUMIU

Lá pelos anos de 1964, o Major Comandante Interino de um Batalhão do interior, ao examinar a pasta recheada de documentos para despacho, deparou com um processo de aposentadoria, ou melhor, de reforma, de um Cabo, que servira àquela OPM (Unidade Administrativa era o termo da época) por mais de 20 anos. 

Como de praxe, reuniram-se, no Gabinete do Comando, meia hora antes do término do expediente da tarde, além do Comandante da Companhia, o então Cap. Spanó, de saudosa memória, Oficiais e Praças da Sub-Unidade, para a homenagem a um servidor de comportamento exemplar, que havia prestado relevantes serviços às comunidades em que servira. 

Minutos antes, porém, examinando o processo de reforma, fixei meu olhar na fotografia do homenageado, achando-a familiar, com aquele toque de “esse cara eu conheço”. Não tive dúvidas, quando vi que o seu R.E. era próximo ao meu e neste instante a minha ficha caiu (o leitor amigo já descobriu que o Major Comandante era eu). 

É o Chaguinhas, falei comigo mesmo, recruta como eu, companheiro lotado na 3ª. Cia do Batalhão Escola Misto, adido ao Quartel de Sorocaba, nos idos de 1939, a Europa já envolvida na 2ª. Grande Guerra Mundial (1939-45). 

Éramos jovens sonhadores, abraçando a carreira na então Força Pública, empenhada no preparo de bons policiais para a segurança do Estado, preocupada também no preparo militar, obedecendo a orientação do Comandante Geral, Coronel do Exército e da Diretoria de Ensino, também composta de instrutores verde-oliva e a instrução era brava. 

Dezesseis horas e trinta minutos, eis que chega o grande momento da despedida, todos perfilados, Chaguinhas na posição rígida. O Sargento amanuense leu os pontos principais de seu assentamento (para o Oficial era Fé de Ofício), o Cap. Spanó proferiu belas palavras destacando passagens significativas e elogiosas de seu subordinado. 

Eu deveria falar por último, como recomenda a etiqueta, mas antecipei às palavras de Chaguinhas. Vou tentar reproduzir a minha fala:


           Meus amigos, quero render minhas homenagens ao meu colega Chaguinhas, recruta como eu na Cia. comandada pelo Cap. Lameirão em Sorocaba, durante todo o ano de 1939.
           Chaguinhas você era admirado por todos nós, pela sua alegria de viver, pela sua lealdade, espontaneidade, inteligência viva, contador de estórias e piadas, tiradas  repentistas e tantas outras qualidades...
           E fui falando, falando, embalado pela inspiração e saudade e num certo momento de minha saudação, lembrei-me de uma passagem que me marcou muito: 10 recrutas, inclusive Chaguinhas e eu, tivemos nossos capotes roubados e as nossa malas arrombadas. Fomos à presença de nosso comandante da Cia., que, nos recebeu bondosamente e relatamos a triste ocorrência. O Cap. Lameirão era muito religioso, portava na ocasião um rosário em suas mãos, tendo à frente um altar com várias imagens de santos. Confessou que custava a acreditar no relatado por nós, adiantando que poderia ser uma brincadeira de mau gosto e que logo os capotes apareceriam. Adiantou também que considerava todos os recrutas muito bonzinhos...
           De imediato, Chaguinhas aparteou e falou com firmeza: Sr. Capitão, aqui todos os recrutas são bonzinhos, mas o meu capote SUMIU!

           
Abreviei o meu discurso, resolvi parar, porque senti intensa emoção em Chaguinhas, os seus olhos marejados de lágrimas; ficou mudo, não conseguiu articular nenhuma palavra, fui ao seu encontro e num abraço saudoso de velhos companheiros, nossas túnicas se orvalharam.

Nunca mais tive notícias do Cb. Chagas. Não sei se ele ainda pertence à nave Terra ou se habita uma longínqua galáxia.

Minha intenção é terminar esta crônica, tentando indexá-la àquela frase incisiva de Chaguinhas, como a firmeza na verdade do Sânscrito SATIAGRAHA, fulcro da pregação de Mahatma Gandhi, operação meritória da Polícia Federal contra a máfia dos colarinhos brancos, os intocáveis.

Antes dessa ação, outras máfias também foram desmascaradas pela Polícia Federal, como a do Mensalão, dos Correios, do Banestado, dos Aloprados do Presidente, escândalos e roubos por toda a parte e, infelizmente, a morosidade dos Magistrados, que não arrematam, não condenam e acabam arquivando a firmeza na verdade.

Os jornais estampam uma declaração estranha de um corrupto intocável, que nas Instâncias Superiores do Judiciário, ele teria mais facilidade de ser absolvido, do que num juizado de 1ª. Instância.

A história nos conta que até 1930, na Republica Velha, havia muita corrupção eleitoral, até mortos votavam, mas havia moral, os homens, os políticos eram honestos.


sábado, 11 de outubro de 2014

VERSOS GUERREIROS

"Quando se sente bater
No peito heróica pancada
Deixa-se a folha dobrada
Enquanto se vai morrer".


 Esses versos pertencem a um poema, da lavra do poeta Tobias Barreto, homenageando a libertação de Montevidéu, sendo adotados, na Revolução Constitucionalista de 1932, como uma Bandeira, incentivando a mocidade paulista, principalmente a classe acadêmica, a suspenderem os seus estudos e acorrerem ao chamamento da alma bandeirante, para defesa de um ideal, que era o retorno da Lei, violada, desde 1930, pelo ditador Getúlio Vargas.

Grande número de estudantes das Arcadas morreram pela causa paulista e aqueles versos guerreiros, do vate pernambucano, são o estribilho do vibrante hino do Centro Acadêmico “11 de Agosto”, da Faculdade de Direito do Largo São Francisco.

Muitos livros históricos reproduziram esses versos e, em monumentos e estátuas, erigidos no sagrado chão paulista, eles surgem, esculpidos muitas vezes em bronze, reverenciando a saga bandeirante e imortalizando os heróis, que tombaram em holocausto à Causa Constitucionalista.

Minha intenção é relacionar esses versos guerreiros com uma cidade, santuário ecológico, onde foi aberto o primeiro poço de petróleo na América do Sul, conhecida também como a Terra do Gigante que Dorme. Essa terra é pequena, mas encantadoramente bela.

Quando os mascates, no passado, com os seus carroções, puxados a mulas ou burros, desciam a Serra de Botucatu, por caminhos ou trilhas, levando, nos seus baús e canastras, uma infinidade de mercadorias, objetos e coisas, carentes no vasto interior de São Paulo, como sal, açúcar, tecidos, linhas, botões, agulhas, carretéis, espelhos, pó de arroz, águas de cheiro, pólvora, espingardas, garruchas, armas brancas, arreios, rédeas e freios, material de pesca, sementes, etc, etc, etc, para a venda ou trocas, normalmente eles estacionavam, para as refeições, num lugarejo ou patrimônio chamado Samambaia, à beira de um rio muito piscoso, conhecido como o Rio do Peixe.

Com o advento da República, Samambaia, já cidade, mudou o nome para Rio Bonito, conservando-o até 1923, quando, num terceiro batismo, chamou-se Bofete, nome oriundo da palavra buffet, que era um armário repleto de alimentos, enfim um guarda comidas, mas na época era chique os mascates falarem: “vamos abrir o buffet às margens daquele rio cheio de peixes”.

Natureza exuberante, Bofete é considerada cidade ecológica e o orgulho de seus filhos se detêm no fato histórico, narrado por Monteiro Lobato, em um de seus livros sobre o ouro negro, afirmando que foi no município de Bofete aberto o primeiro poço de petróleo na América do Sul.




Vamos esclarecer: em 1894, Eugênio Ferreira, filho de rico fazendeiro da terra, formou-se engenheiro no Texas, Estados Unidos, época em que os ricos fazendeiros vendiam todo o gado, empregando os seus milhões de dólares em poços de petróleo, que afloravam na terra. Os poços se multiplicavam assustadoramente, porque a motorização vinha a galope, substituindo as máquinas a vapor, sendo início do milagre econômico da terra do tio Sam.

Eugênio Ferreira não teve dúvidas! Na fazenda de seu pai, abriria os poços e ganharia milhões de contos de réis. Comprou, então, brocas e todo o material para prospecção do petróleo e embarcou para o Brasil, com o canudo de Dr. Engenheiro, e com aquele grande sonho, aquela ilusão sem medidas, de iniciar em Bofete o milagre tupiniquim.

Depois de um ano, quatrocentos metros foram perfurados e nesse ponto a broca se quebrou. Ele não desanimou e, com um intérprete conterrâneo, de origem alemã chamado Teófilo Prat (dois de seus bisnetos fizeram carreira em nossa PM, devendo ser Oficiais da nossa Reserva), Eugênio Ferreira rumou para a Alemanha, comprando novamente todos os equipamentos de perfuração, continuando os trabalhos, em busca daquele sonho, mas a broca ao atingir 800 metros, também se quebrou, quebrando toda a fortuna do seu pai. Não jorrou petróleo, apenas água sulfurosa, cheiro forte de enxofre, que dizem ser ótimo remédio para problemas de fígado e estômago. Mas tudo o que aconteceu não tira a glória de ser Bofete, onde foi aberto o primeiro poço de petróleo da América do Sul, como escreveu o grande escritor Monteiro Lobato.



Como escrevi acima, nessa terra encantadora existe um gigante que dorme. Nos contrafortes na Serra de Botucatu, três morros se destacam, formando, no conjunto topográfico, uma figura enorme, com cabeça, tronco e membros; o perfil de seu rosto, pescoço, sua barriga, pernas e pés configuram uma enorme figura humana, conhecida Bofete como a terra do gigante que dorme. Como a natureza é caprichosa!

Acontece que na minha infância, esse gigante me amedrontava. Era a voz do povo, e eu acreditava, que em todas as madrugadas ele vinha beber água e roubar galinhas nos quintais para seu banquete, naquelas quebradas da serra. A infância sempre povoada de anjos e fadas, mas também de bruxas e bruxos.

Cresci, conheci o mundo, deslumbrei-me, mas nunca esqueci do gigante que, ao longo do tempo tornou-se meu amigo. Cantei loas àquela figura, reverenciando um bandeirante em descanso, dialoguei com os Deuses agradeci a Eles tamanha beleza, dádivas dos céus à minha encantadora Bofete, onde nasci e onde quero para minha morada.

Desculpem-me todo o exagero, neste excesso de amor! Nesta minha querida cidade, no Campo Santo, um conjunto fechado, segurança máxima, silêncio absoluto, principalmente à noite; existe uma Capela e, numa de suas paredes, na parte externa, reproduzi aqueles versos de Tobias Barreto. Na outra parede, vis-à-vis com o Gigante, escrevi minha mensagem, início de uma prosa para toda a Eternidade:


"Meu Gigante, meu grande amigo, conta-me as tuas andanças pelas galáxias do Céu e eu te contarei as minhas venturas e desventuras neste mundo de Deus".


Ia me esquecendo que, encimando a Capela, o nosso padroeiro Santo Expedito, como Sentinela do Altíssimo.

domingo, 14 de setembro de 2014

ACADEMIA DA POLICIA MILITAR DO BARRO BRANCO

Linda manhã de 04 de agosto, temperatura amena, céu de brigadeiro, o belo Quartel da Academia da Cantareira engalanado, prestigiando a outorga de medalhas do Centenário da Escola de Oficiais aos veteranos que integraram as diversas Turmas de Aspirantes, a partir de 1944, ano que marcou a primeira do Barro Branco, da qual tivemos a honra de participar.

Éramos 38 Aspirantes, os corações pulsando, entusiasmo pleno, pois a Força Pública tinha sido convocada para a guerra, pairando em nossas mentes a glória de lutar nos campos da Europa contra o nazifascismo, morrendo pela Pátria..., mas a guerra acabou em maio de 45, frustrando os nossos sonhos. 

Setenta anos se foram! A grande maioria de nossos queridos irmãos já passaram o Portal da Eternidade e habitam as galáxias dos céus. Délio de Barros Veloso, Hugo de Castro Viana, Amaro Pereira e eu, somos o que restou dos Aspirantes de 1944.

Com a alma dolorida ressaltamos 3 companheiros que morreram tragicamente:

                                    - Benedito Neto, paulista de São Simão, que numa ocorrência caiu fulminado com uma bala no crânio;
                                 - Waldir Alves de Siqueira, capixaba de Cachoeiro de Itapemirim, morto covardemente por um bandido, cinco tiros à queima roupa; e
                                 - José da Silva Bueno, paulistano da Pompeia, pescador de alto mar, desapareceu do barco. O que teria acontecido?  Um ET o teria abduzido? Teria caído ao mar e devorado por tubarões? As correntes marítimas teriam levado Bueno para longe, talvez para a África? Ou uma sereia apaixonada o teria raptado, carregando-o para as profundezas dos mares...

Gratificante para todos nós foi o reencontro com velhos amigos, aspirantes de turmas posteriores! A presença do Cel. Pedro Resende, aspirante de 1970, dentre os muitos méritos na carreira, ressalta ser o fundador da ROCAM. Ele encheu meu coração e alma de orgulho e alegria!

Finda a cerimônia Pedro Resende e eu fizemos uma andança da saudade: percorremos os campos de Hipismo, Tiro, Esportes, os Alojamentos, as Salas de aula, o Laboratório, o Rancho, os pátios de memoráveis desfiles. Por muitos minutos quedamos silenciosos com o pensamento vago... lembranças, saudades, nostalgia.

Lembramos de um poema de Luís Guimarães Jr:


VISITA À CASA PATERNA

Como a ave que volta ao ninho antigo,
Depois de um longo e tenebroso inverno,
Eu quis também rever o lar paterno,
O meu primeiro e virginal abrigo.

Entrei. Um gênio carinhoso e amigo,
O fantasma, talvez, do amor materno,
Tomou-me as mãos - olhou-me grave e terno,
E, passo a passo, caminhou comigo.

Era esta sala...(Oh! se me lembro! e quanto!)
Em que, da luz noturna à claridade,
Minhas irmãs e minha Mãe... O pranto

Jorrou-me em ondas... Resistir quem há de?
- Uma ilusão gemia em cada canto,
Chorava em cada canto uma saudade...



Comovidamente quero terminar estes meus escritos homenageando um velho coronel que por mais de dez anos comandou o CIM:

CORONEL JOSÉ FRANCISCO DOS SANTOS

Comandou o Centro de Instrução Militar (CIM) por vários anos, na época Getuliana dos Interventores Federais nos Estados. Era obrigatória a presença do Interventor na festa do Espadim (24/5) e na festa da Espada, no dia 15/12, tradição que continua até hoje. Os Interventores mudavam, mas o Cel. José Francisco dos Santos não, sempre firme no comando.

Por 10 anos, ou mais, ele discursava, saudando o Interventor e os Cadetes em maio e o Interventor e os Aspirantes em dezembro. Pragmático, os seus discursos eram um caminho a seguir, continham ótimos conselhos e exemplos dignificantes. Mas... os anos se passaram e o Cel. José Francisco dos Santos, contra a sua vontade, foi passado para a Reserva. Retirou-se da sua querida Força Pública e do seu amado CIM, na época, já localizado no Barro Branco. Mais e mais anos  decorreram, os seus cabelos branquearam, suas pernas enfraqueceram e sua mente era povoada de sonhos e saudades.

Aos 85 anos adoeceu, baixou ao hospital várias vezes, mas há sempre uma última vez. Na véspera da sua morte, na Cruz Azul, delirou, e é certo que seu pensamento vagou pelas epopéias de 22, de 24, de 30 na Batalha de Itararé, no Túnel da Mantiqueira em 32.

Quantas visões e sons desconexos, pela madrugada afora, em sua mente agonizante! No pesadelo ou sonho dos heróis, também teria voado para os campos do Paraná, na Foz do Iguaçu, com os Legalistas de São Paulo, defendendo a União, contra os revoltosos de Isidoro Dias Lopes, de Miguel Costa e de Luiz Carlos Prestes. No seu delírio, continuou o voo pelas terras de Mato Grosso, Goiás, todo o nordeste até Minas Gerais. De Minas, a Coluna retornou quase que pelo mesmo roteiro da ida e se exilou na Bolívia em 1927, acossada pelos homens da lei.

De inopino, já de madrugada,  assim me contou sua filha, ele se levanta, assume a postura espartana e pede o seu fardamento e o boné. Atônita e preocupada, ela improvisa, entregando-lhe um pijama, à guisa de farda e um chapéu substituindo o quepe. O velho soldado se veste, põe o "boné”, empertiga-se todo e se perfila:

-       Estou bem minha filha? O meu uniforme está correto?
-       Sim papai.
-  Hoje, 24 de maio, o Interventor já está chegando... vou receber sua Excelência...
-   O velho guerreiro vacila, se inclina, cai, tenta levantar-se, não consegue e... morre!


quinta-feira, 21 de agosto de 2014

QUARTEL DO GLICÉRIO




Em situação de abandono completo, o velho Quartel do Glicério, também conhecido como da Tabatinguera, no Parque D. Pedro II, que abrigou o 2.º Batalhão de Guardas do Exército, deve ser restaurado. Ao menos, esse é o desejo de um grupo de militares da Reserva, que lançaram, uma campanha para tentar salvar o edifício histórico, cuja construção data do século XVIII.

Louvável a intenção desse grupo de militares, que fizeram um ato cívico em frente ao velho casarão, lançando a campanha para restaurar o edifício histórico, que abrigou Unidades de Elite do Segundo Exército, hoje Comando Militar do Sudeste.

O Militar da Reserva ou Reformado é, antes de tudo, um saudosista, pois ama tudo o que se relaciona com as coisas castrenses. Ele tem saudades da caserna, dos desfiles, das manobras militares, dos dobrados das bandas de música. É nostálgico, lembra constantemente do seu quartel, dos velhos comandantes, dos seus companheiros de ideal. Sendo louvável, pois, sob todos os títulos, a reunião dos militares Cara-de-Leão que estão procurando sensibilizar o povo de São Paulo para que o quartel tenha aquela imponência do passado.

O 2.º Batalhão de Guardas do Exército foi a última Unidade a ocupar o vetusto quartel, construído de taipa pilão, socada com a força dos pés dos escravos, que dançavam ao som de batuque sobre argilas, amassando, com o barro, pedras e vegetais, erguendo as largas paredes.

Foi construído na segunda metade do século XVIII, tendo as seguintes denominações:


1765 – Chácara do Fontoura 
1852 – Convento Irmãos Duarte 
1855 – Cônego do Monte Carmelo 
1859 – Governo Provincial 
1860 – Seminário de Educandos 
1861 – Seminário de Educandas 
1862 – Hospício de Alienados 
1896 – Quartel da Guarda Cívica da Força Pública 
1930 – Quartel do 6.º e 7.º Batalhões de Caçadores da FP 
1932 – Ocupado pelo Exército 
1964 – 7.ª Cia de Guardas 
1970 – 2.º Batalhão de Guardas 
1996 – 3.º Batalhão de Choque da Polícia Militar 


Tombado pelo CONDEPHAT, não se pode mexer, adulterar sua arquitetura. Os tempos passaram, o prédio envelheceu muito e não há verbas para a sua manutenção. É uma pena! 

Em fins do século XIX, ele foi sede dos 1.º e 2.º Corpos da Guarda Cívica, Unidades de escol da antiga Força Pública, encarregada da segurança da Capital e Interior, protegendo uma população que aumentava assustadoramente pelos imigrantes, atraídos pelo advento do ouro verde, os grandes cafezais.

Em 1925, os dois Corpos da Guarda Cívica se transformaram no 6.º e 7.º Batalhões de Caçadores, efetivos da Brigada Militar, formada pelo Cel. Pedro Dias de Campos, em perseguição à Coluna Revolucionária, comandada pelo Gen. Miguel Costa, erroneamente denominada Coluna Prestes. Em consequência, todo o acervo e oficiais instrutores da extinta Guarda Cívica, inclusive o Comandante Cel. Alexandre Gama, foram transferidos para a Guarda Civil, fundada a 22 de outubro de 1926.

Em 1932, com a derrota de São Paulo na Revolução Constitucionalista, frente a Getúlio Vargas, o casarão do Glicério e todas as edículas foram uma das presas de guerra, aquartelando então Unidades do Exército.

Mais duas presas de guerra foram o Campo de Marte – até hoje ocupada uma área pelo Parque de Aeronáutica. A terceira presa foi o Quartel da Força Pública, em Itapetininga, sediando Unidades do Exército durante muito tempo. Foi devolvido pelo Governo Federal, sendo hoje a sede do Departamento de Estradas de Rodagem do Estado.

Em 1990, acordados a União e o Estado, o quartel do Glicério foi devolvido, nele se aquartelando o nosso 3.º Batalhão de Choque mas, passados 10 anos, a PM, sem recursos para a manutenção altamente dispendiosa, sem ajuda do CONDEPHAT, transferiu aquela OPM para novo quartel, mantendo na velha sede apenas uma guarda para evitar depredações e ocupações dos homens sem teto, que algumas vezes já tentaram invadí-lo.

Qual será o destino desse velho Monumento de Taipa? Oxalá os saudosos reservistas Cara-de-Leão consigam a realização do sonho, altamente nobre. Milagres acontecem!!!

Parece-nos que o milagre está começando, neste ano de 2014, pois é interesse do Governo do Estado instalar no Quartel do Glicério o Museu da Polícia Militar, tendo já uma comissão de estudos para restaurá-lo, possibilitando o restabelecimento da integridade física dessa relíquia histórica, recuperando a reaqualificação de toda a região, devolvendo a vida e a funcionalidade, quase sempre esquecida e desvalorizada, no coração de São Paulo. 







quinta-feira, 31 de julho de 2014

COMPAIXÃO PARA COM OS COLÉRICOS


Há uma passagem épica na história da nossa pátria, com referência à Guerra do Paraguai, mais precisamente no episódio da Retirada da Laguna, magistralmente descrita pelo Visconde de Taunnay.
Foi quando o Coronel Camisão determinou que 102 combatentes, portadores do “cólera-morbus”, fossem abandonados, depois da Batalha de Nhandipá, no dia 26 de maio de 1867. Perseguidos pelos paraguaios, Camisão não teve outra alternativa, senão abandoná-los, para não comprometer a segurança do grosso da tropa, estropiada, faminta e inúmeros feridos; carregar os coléricos era humanamente impossível.
O único sobrevivente daquela chacina praticada pela Cavalaria Paraguaia foi o Cabo Calixto que mais tarde descreveu aquela tragédia:


Entre os coléricos havia a vivandeira Preta Ana, gravemente doente, mas ainda com pequena vitalidade, sendo encarregada de empunhar um cartaz com dizeres em letras grandes, escrita com carvão, pedindo misericórdia. Eu e meus companheiros fomos levados para a mata e depois de já haver ficado noite. Era um capão redondo, cujo centro fora roçado.

As perguntas que fazíamos sobre os motivos de nos deixarem ali, diziam que iam fazer uma emboscada aos paraguaios e que depois viriam buscar-nos. Ao alvorecer do dia imediato, estávamos sós. Só se ouvia de todos os lados um único clamor: ai, ai, água, água pelo amor de Deus!

Mas não havia ninguém que desse água aos doentes. Ainda no lusco-fusco dessa manhã, apareceu um esquadrão da cavalaria paraguaia. Ao chegar, a cavalaria deu uma descarga contra nós. Vendo, porem, que éramos doentes, os soldados apearam e, formando fileira, foram lanceando a eito, sem poupar nenhum dos que se achavam ao alcance de seus braços. A chegada dos paraguaios foi ali como creolina na bicheira; todos, desesperadamente, procuravam levantar-se e fugir. Eu estava bem no meio dos doentes, mas não tinha forças para ficar em pé, fui de gatinho pulando por cima dos outros, e caindo do lado de baixo do terreno, que era um declive, continuei a engatinhar pelo mato abaixo, até um corregozinho de pouca água, ouvindo sem cessar um terrível coro de ais, os mais cruéis lamentos. Deitei-me de bruços e bebi dois ou três goles de água. Incontinenti, senti uma espécie de surdez e a vista escura e, num estado de ligeiro desmaio, fiquei alguns minutos.

Recobrando os sentidos, continuei mato adentro, até sair do campo. Então vi que o capão estava todo cercado de soldados. Vendo que alguns coléricos que conseguiram chegar até o campo eram lanceados, fiquei na beira do mato. Mas ou menos a uns cem metros, achavam-se alguns cavaleiros paraguaios. Escondi-me debaixo de um pé de cipó prata. Esse pé de cipó tinha um tronco grosso e dos lados os galhos chegavam até o chão.

Tem aquele nome porque suas folhas são verdes por cima e brancas por baixo.

O dia estava acabando de clarear. Deitei-me de bruços e com as mãos ia cautelosamente puxando as folhas secas do chão e me rebuçando com elas.

Cobri primeiro os pés e depois o resto do corpo, até a cabeça, mas de modo que continuasse a poder observar o que se passava por perto. Pelas oito horas da manhã os paraguaios desarrearam os animais e próximo dali acamparam, ficando quietos o resto do dia.

Dali iam buscar água naquele córrego, passando perto do pé de cipó, em cujos ramos pisavam. O que eu mais receava era que seus cachorrões me descobrissem. Achava impossível que estes não dessem pela minha presença, adestrados como eram...

Os clarins já haviam dado o toque de partida e debandada toda tropa. No roçado todos os coléricos estavam mortos, o corpo da Preta Ana estava todo lancetado, encimado com um cartaz: “COMPAIXÃO PARA COM OS COLÉRICOS”, mas os paraguaios lanceiam com os seus cavalos aqueles pobres diabos, abandonados à própria sorte, esquecidos pela história tradicional.


domingo, 1 de junho de 2014

ESTÓRIAS PICANTES

     Há muitas passagens interessantes, que ouvimos alhures, que precisam ser repassadas, para que não sejam esquecidas na voragem dos tempos, sendo necessário que os aprendizes de agora, passem-nas para frente, para outras pessoas, que também repetirão às gerações vindouras.
     Vou começar com uma estória, que não é nossa e sim do Exército Americano, em plena Segunda Grande Guerra Mundial (1939-45). Sabemos que o Exército do Tio Sam invadiu o norte da África, para combater os inimigos nazi-fascistas, (Hitler e Mussolini), e isso aconteceu com a ajuda do Brasil, autorizando o trampolim para a África na base de Natal, no Rio Grande do Norte.
     Não me lembro se foi no Egito ou no Sudão, população de cultura árabe ou muçulmana, quando um coronel americano ficou furioso com a seguinte cena em pleno deserto:

Uma mulher grávida, com um menino nos braços, com feixes de lenha na cabeça, três filhos pequenos agarrados à sua saia, caminhava pelo deserto, tendo à frente o seu marido montado num belo corcel. O coronel, num gesto brusco, fez apear o chefe daquela pobre família, com voz de prisão e, com palavras incisivas, advertiu-o de sua atitude desprezível, vergonhosa, ele a cavalo e sua mulher exausta, grávida, carregando uma criança, com feixes de lenha na cabeça e filhos menores agarrados a sua saia...
Nesse momento, a mulher tomada de ira, debaixo de um calor abrasador, ameaçou agredir o coronel, proferindo as seguintes palavras, traduzidas por um assessor árabe: O senhor não tem nada com a nossa vida, cuide da sua. Deixe-o em paz para nossa caminhada. Quero o meu marido bem descansado em casa esta noite.

     O Mal. Floriano Peixoto foi nosso segundo Presidente da República, sucedendo ao Mal. Deodoro da Fonseca, que, doente e atribulado pelas lutas políticas, renunciou, passando o governo ao seu vice-presidente, em 1891.
     O novo Presidente, pela Constituição, seria obrigado a convocar novas eleições, mas não o fez. Continuou governando o Brasil, com mão de ferro e muitos almirantes e generais que reclamaram, foram despojados de suas funções e reformados.
     Na Revolta da Armada, em 1893, no Rio de Janeiro, os Alms. Saldanha da Gama e Custódio de Melo aliaram-se aos Federalistas do Rio Grande do Sul, comandados por Gumercindo Saraiva. A intenção, entre outras, era a restauração da Monarquia.
     O Presidente de São Paulo era Bernardino de Campos, que, ajudou Floriano Peixoto a consolidar a novel República, ordenando à Força Pública, que fechasse todos os portos do litoral paulista, impedindo o desembarque de navios de guerra da Marinha e também guarnecesse a fronteira do Paraná, ameaçada de invasão pelos rebeldes do sul. Depois da retirada dos federalistas gaúchos, o nosso 2º. Batalhão de Caçadores também tomou parte no cerco da Lapa, próximo a Curitiba, de lá voltando vitorioso com o título de “Dois de Ouro”.

     Vamos deixar a história de lado e penetrar em duas estórias de Floriano:


     No posto de Major, Floriano comandava um Batalhão de Caçadores, sediado numa cidade do interior de Santa Catarina.
     Além de suas funções normais como Comandante, o que mais o irritava eram as constantes aparições de mães, queixando de soldados do Batalhão, que “teriam feito mal” às suas filhas. Eram dezenas de mães aflitas, que jogavam ao nobre major a solução de seus problemas.
     Floriano, depois de consultar seus oficiais, deliberou reunir no quartel todas as mães queixosas, que, pressurosas, atenderam ao convite e dezenas delas reuniram-se na ante-sala do Comando. Calmamente o major ouvia queixas e mais queixas do grande mal, praticado pelos seus subordinados. Depois de algum tempo sentenciou: Senhoras mães, segurem as suas cabras em suas casas, que eu segurarei os meus bodes no quartel. E a reunião foi terminada.



     Algum tempo depois, no mesmo quartel do interior de Santa Catarina, o Maj. Floriano recebeu a visita de uma mocinha, queixando do soldado tal, que dias antes, num domingo à noite, numa praça deserta, os dois de folga, quando aconteceu a tragédia, pois tinha sofrido o grande mal, cometido pelo seu namorado; inconformada, ela pediu uma solução enérgica do Comandante, talvez obrigando o soldado a casar.
     Floriano ouviu com muita serenidade, resolvendo, tomar por termo as declarações da queixosa. Perguntas, respostas, mais perguntas e respostas, chegou ao fim a declaração acusatória da grande “vítima”.
     Foi lido todo o termo declaratório, chegando a vez das assinaturas, da mocinha e do Comandante.
     Na época, as canetas eram diferentes, dotadas de pena e esta tinha que ser molhada e, quando ela ia assinar, o major mudava a posição do tinteiro; repetiram-se as cenas várias vezes e sempre o tinteiro mudava de posição, pelas mãos do Major.
     Aí a moça reclamou: “Como é que o senhor manda assinar e tira o tinteiro da caneta?” Calmo e fleugmático, Floriano respondeu:

    - Porque a senhorita também não fez o mesmo naquela noite de domingo no parque deserto?...

     É atribuída a Floriano a seguinte frase:

     "Para quem Deus não deu filhos, o diabo deu sobrinhos".

domingo, 4 de maio de 2014

O Centenário da Aviação Militar Paulista

Entrega da Salva de Prata ao Grupamento Aéreo - "João Negrão"
Do lado esquerdo está D. Juraci, filha do heróico piloto do Hidroavião JAHÚ 


No dia 30 de abril pp, a Câmara Municipal de São Paulo prestou uma homenagem ao Grupamento Aéreo, ofertando-lhe uma salva de prata.
Nessa oportunidade, foi o lançamento o livro de minha autoria: O Centenário da Aviação Militar Paulista.
A solenidade foi presidida pelo Cel. Camilo, ilustre vereador paulistano.


Salva de Prata


Oferta do livro ao Cel. Camilo



       Autografando o livro ao Cel. Gamberoni - Comandante do Grupamento Aéreo


O livro em apreço estará à venda nos seguintes postos: 


- Sociedade Veteranos de 32 -MMDC (ao lado do quartel do Corpo de Bombeiros na Praça da Sé);
- Capelania Militar da PM (R. Jorge Miranda, 264);
- Serviço de Subsistência da PM (R. João Teodoro, 413);
- Clube dos Oficiais da Reserva (R. Tabatinguera, 278);
- Associação das Pensionistas da Caixa Beneficente (R. Rodrigo de Barros, 97).





sábado, 12 de abril de 2014

CURIOSIDADES

O OCEANO COMO TÚMULO


Em 1931, Vasco Cinquini morreu tragicamente ao pilotar um avião na Bahia de Santos. Seu corpo e o aparelho repousam no fundo do oceano.

É bom lembrarmos que Vasco Cinquini foi um dos heróis, tripulante do Hidroavião Jahú (glória nacional) no voo histórico da Itália ao Brasil em 1927.


                                                                      - / - 

Os Tenentes Machado Bitencourt e Gomes Ribeiro, pilotos da Aviação Militar Constitucionalista, em 1932, morreram heroicamente no bombardeio de um avião de guerra da Ditadura durante a Revolução, que barrava o Porto de Santos, impedindo o desembarque de farto material bélico comprado nos Estados Unidos. 

Como Vasco Cinquini também o aparelho e os seus pilotos jazem no fundo do mar na Baia de Santos perto do Farol da Moela.

                                                                   -/ - 

Mudando de assunto, faço uma pergunta aos meus amigos: é possível um Segundo Tenente na Reserva subir na carreira e ascender ao posto de Coronel?!

Eu conheço dois casos! Para algum amigo curioso, contarei essa história reservadamente.....

sábado, 5 de abril de 2014

TRÊS COMANDANTES DO MEU TEMPO

A Academia da Polícia Militar do Barro Branco teve várias denominações: 1910 – Curso Complementar Literário e Científico, indicação da Missão Militar Francesa; 1913 – Corpo Escola, compreendendo Curso Geral para Inferiores e Curso Complementar para Alferes e Tenentes, também organizado pela Missão Militar Francesa; em 1920 mudou a denominação para Batalhão Escola; 1924 – O Batalhão Escola é agora o Centro de Instrução Militar (CIM); 1950 – passa à denominação de Centro de Formação e Aperfeiçoamento (CFA); 1970 – Com a fusão da Força Pública e Guarda Civil recebe outro batismo, é agora Academia de Polícia Militar; 1978 – até os dias de hoje é Academia de Polícia Militar do Barro Branco. 
Neste contexto histórico, queremos citar três eméritos comandantes do nosso notável estabelecimento de ensino:


CORONEL JOSÉ FRANCISCO DOS SANTOS

Comandou o Centro de Instrução Militar (CIM) por vários anos, na época Getuliana dos Interventores Federais nos Estados. Era obrigatória a presença do Interventor na festa do Espadim (24/5) e na festa da Espada, no dia 15/12, tradição que continua até hoje. Os Interventores mudavam, mas o Cel. José Francisco dos Santos não, sempre firme no comando. Por 10 anos, ou mais, ele discursava, saudando o Interventor e os Cadetes em maio e o Interventor e os Aspirantes em dezembro. Pragmático, os seus discursos eram um caminho a seguir, continham ótimos conselhos e exemplos dignificantes. Mas... os anos se passaram e o Cel. José Francisco dos Santos, contra a sua vontade, foi passado para a Reserva. Retirou-se da sua querida Força Pública e do seu amado CIM, na época, já localizado no Barro Branco. Mais e mais anos decorreram, os seus cabelos branquearam, suas pernas enfraqueceram e sua mente era povoada de sonhos e saudades.

Aos 85 anos adoeceu, baixou ao hospital várias vezes, mas há sempre uma última vez. Na véspera da sua morte, na Cruz Azul, delirou, e é certo que seu pensamento vagou pelas epopéias de 22, de 24, de 30 na Batalha de Itararé, no Túnel da Mantiqueira em 32.

Quantas visões e sons desconexos, pela madrugada afora, em sua mente agonizante! No pesadelo ou sonho dos heróis, também teria voado para os campos do Paraná, na Foz do Iguaçu, com os Legalistas de São Paulo, defendendo a União, contra os revoltosos de Isidoro Dias Lopes, de Miguel Costa e de Luiz Carlos Prestes. No seu delírio, continuou o voo pelas terras de Mato Grosso, Goiás, todo o nordeste até Minas Gerais. De Minas, a Coluna retornou quase que pelo mesmo roteiro da ida e se exilou na Bolívia em 1927, acossada pelos homens da lei.

O Cel. José Francisco dos Santos agoniza e sonha ainda mais – teria lido a Retirada dos Dez mil de Xenofonte, as Guerras de Hamilcar e Aníbal, os Generais de Cartago e se convence que, nos 3 anos de guerrilha, a nossa epopéia é bem maior, é mais épica, são 30 mil quilômetros de agruras, fome, sede, as intempéries do tempo e a luta pelo interior do Brasil... Muito nevoeiro aqui no Barro Branco, minha filha, estou com frio... 

De inopino, já madrugada, ele se levanta, assume a postura espartana e pede a sua filha o seu fardamento e o boné. Atônita e preocupada, ela improvisa, entregando-lhe um pijama, à guisa de farda e um chapéu substituindo o quepe. O velho soldado se veste, põe o ”boné”, empertiga-se todo e se perfila:

- Estou bem minha filha? O meu uniforme está correto?
- Sim papai.
- Hoje, 24 de maio, o Interventor já está chegando... vou receber sua Excelência...

O velho guerreiro vacila, se inclina, cai, tenta levantar-se, não consegue e... morre!
Este derradeiro diálogo foi me contado pela filha do nosso herói. 


CORONEL HARRISON DE SOUZA FERRAZ

Não menos edificante é a história do Cel. Harrison de Souza Ferraz, o “Paulista de Cabrobó”. Muito jovem, vindo do nordeste, Harrison aportou em terras da Paulicéia, em meio a tiros e canhonaços, em plena Revolução de 1924, chefiada, como já vimos, pelo Gen. Isidoro Dias Lopes do Exército e pelo Maj. Miguel Costa, Fiscal e exímio Cavalariano do nosso Regimento.

Empolgado pela luta, alistou-se nas fileiras da Força Pública, sob o comando do Cel. Pedro Dias de Campos, defensor da legalidade. Foi o primeiro marco da sua caminhada na tropa de Piratininga, que um escritor a descreveu como o Pequeno Exército Paulista.

Após a retirada de São Paulo, as tropas legalistas perseguiram os revoltosos até Foz do Iguaçu, no Paraná, onde também chegou uma pequena Coluna, comandada pelo Cap. Luiz Carlos Prestes, vinda do Rio Grande do Sul.

A perseguição à Coluna Revolucionária, comandada por Miguel Costa (erradamente chamada Coluna Prestes), só terminou em 1927, quando os rebeldes se exilaram na Bolívia.

Em 1930, o Ten. Harrison, comandando um pelotão, participou da Batalha de Itararé, contra as tropas de Getúlio Vargas, que invadiriam São Paulo, a caminho do Catete, mas essa Batalha de Itararé, que seria a maior batalha no Brasil, não aconteceu, é mais um paradoxo da história.

Em 1932, vemos o Ten. Harrison, sob a Bandeira das 13 listras, defendendo o ideal dos Paulistas, nas escarpas da Mantiqueira e da Serra do Mar. Em 1935 defendeu São Paulo na Intentona Comunista de Prestes e em 1938 na Ação Integralista de Plínio Salgado. 

Harrison galgou todos os postos da hierarquia militar por merecimento, e no entremeio de suas atividades castrenses dedicou-se à literatura, publicando mais de uma dezena de livros, enaltecendo sempre o seu idealismo pela Pátria, por São Paulo, a sua terra de adoção e a sua querida Força Pública. Foi membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, da Academia de Letras, Academia de História e tantas outras entidades culturais e, mercê de sua inteligência, cultura geral e profissional, o Governador Carvalho Pinto o nomeou Comandante Geral. O soldado raso de 1924 é agora, em 1960, o Cel. Comandante Geral da Milícia Paulista. Como descrevi sobre o Cel. José Francisco dos Santos, também a história de Harrison, no fim da vida, foi emocionante, edificante, sentimento e emoção! 

Passaram os anos, ele, agora na Reserva, envelhece e fica gravemente enfermo. Seu filho Inhaúma convenceu sua mãe, dona Haidê, a transferir a residência para o Rio de Janeiro, esquecendo que a cidade maravilhosa para o Cel. Harrison era São Paulo. 

Em 1983, fui ao Rio de Janeiro e visitei a família, queria conversar com o coronel, levar a minha homenagem ao grande amigo, ao grande mestre, de quem recebi aulas maravilhosas da nossa história; estava em estado de coma, também delirava, pronunciando sons desconexos, eram os pesadelos, os sonhos dos heróis. Dona Haidê, dedicada esposa, muito triste, contou-me que, nos últimos dias, nos estertores de seus sofrimentos pedia:

- Haidê, me leva pra São Paulo...
- Haidê, me leva pra São Paulo...
- Me leva pra Praça da Sé, Haidê. Me leva pra Praça da Sé Haidê.

Três dias depois, já em São Paulo, recebi um telefonema de dona Haidê – Harrison morreu... fiz uma oração e um pedido de paz para a alma do grande comandante, do grande guerreiro. 


CORONEL HELIODORO TENÓRIO DA ROCHA MARQUES

Durante minha vivência na PM, iniciada em 1939, desde que assentei praça no antigo CIM da Força Pública, até os dias de hoje, neste nosso último Quartel, e lá se vão muitos anos, encontrei gentes de alto quilate, homens de invulgar conduta moral, verdadeiros mestres, exemplos edificantes de inteligência, cultura, honradez, civismo e outras tantas virtudes, que marcaram muito a minha vida.

Já tive o privilégio de nomear muito deles e, hoje estou escrevendo sobre um instrutor de raras qualidades e excelsas virtudes, que, em suas aulas, inflamava a consciência de todos os cadetes com a seguinte expressão:

Os senhores, Militares da nossa Centenária
Corporação, pertencem à classe Nobre da Nação

Essa frase até hoje ecoa em minha mente, e em meu coração, ressoando também nas mentes e corações de todos os que tiveram a honra de ter, o saudoso e nobre Cel. Heliodoro Tenório da Rocha Marques, como condutor de homens, mestre emérito e inconfundível, norteando-nos no sacrossanto dever em defender a Pátria, naqueles tempos envolvida na 2ª. Grande Guerra, contra o nazi-nipo-facismo. 

A biografia do Cel. Heliodoro é exuberante! Naturalidade pernambucana, paulista de coração, brasileiro acima de tudo, nascido em 1904, no município de Pedra. Sem perspectiva em seus pagos, mudou-se para São Paulo, alistando-se como soldado da Força Pública em 1921 com apenas 16 anos de idade.

Galgou todas as promoções de praça, matriculou-se no Curso Especial Militar, sendo declarado Aspirante em 1924.

Participou da Revolução de 1924, sendo promovido a 2º. tenente em julho, a 1º. tenente em novembro desse ano, ambas por ato de bravura. Em agosto de 1925 já ostentava os galões de capitão, aos 21 anos de idade. No ano seguinte, comandando uma Companhia do 2º. BC, o “Dois de Ouro”, lutou no Paraná ao lado das tropas legalistas contra os revolucionários da Coluna Miguel Costa-Prestes.

Em 1930, capitão do 3º. Batalhão de Caçadores, defendeu Itararé, Senjés e Morungava, contra as tropas getulistas comandadas pelo Gen. Miguel Costa. Em 1931 participou da Abrilada, o 1º. protesto contra a Ditadura Vargas, sendo preso com dezenas de oficiais e praças. Como castigo, foram todos transferidos para Delegacias de Polícia do interior.

A Revolução Constitucionalista de 1932 é o ponto alto do seu patriotismo. Sua atuação é febril na luta de São Paulo, defendendo os postulados da Democracia, exigindo a Lei Magna, a Constituição Brasileira. Em abril desse ano é ferido pela explosão de uma bomba, matando o Cel. Júlio Marcondes Salgado, Comandante Geral da Força Pública e seu assistente, o Maj. Marcelino. Na frente sul, comandou o Batalhão “14 de Julho”, composto por jovens universitários, nos duros combates de Buri e Capão Bonito.

Terminada a Revolução foi preso, processado pelo Governo Ditatorial e, quando ouvido a termo, afrontou os seus interrogadores, confirmando sua participação na execução da luta, afirmando que lamentava a derrota de São Paulo e que, se pudesse, faria tudo novamente.

Afastado das fileiras da Força Pública, escreveu um livro de parceria com o Cap. Odilon Aquino de Oliveira, o clássico “São Paulo contra a Ditadura”, obra prima sobre a Revolução, que teve várias edições apreendidas pela polícia política de Getúlio. Os dois oficiais foram reformados administrativamente e só voltaram à ativa com a anistia em maio de 1934.

Em 1938 foi promovido a major e classificado no CIM, como Diretor de Ensino até 1944, transmitindo as várias gerações lições magníficas da carreira militar e cidadania. Em 1945, promovido a tenente coronel, por merecimento, nomeado comandante do 6º. BC em Santos. Dois anos depois voltou ao CIM, comandando as Escolas de Oficiais, Sargentos e Cabos. Em 1953 no posto de coronel assumiu o Cargo de Chefe do Estado Maior da Corporação, passando para a Reserva em 1960.

Passam os anos, os heróis também adoecem, envelhecem e morrem. Seu dedicado filho, o Cel. Paulo Tenório, escudeiro fiel, vigiava sempre os seus passos.

Às vésperas da grande viagem, os pesadelos, que são os sonhos dos bravos, rodeavam o herói agonizando, que balbuciava frases confusas, todas elas girando em torno da sua vivência guerreira, nos campos de Goiás, Mato Grosso, de Itararé, Morungava, Catiguá... as trincheiras de Buri, da Mantiqueira, do Túnel...fechou os olhos aos noventa anos.

domingo, 9 de março de 2014

PADRE CALAZANS NOS CONTOU

          Num bairro pobre de Paris, um Padre recebeu ordem de seu Bispo para construir uma igreja. Bairro proletário, habitado em grande parte por materialistas e comunistas. Era época de Stalin, o ditador da União Soviética.
           Missão impossível... mas a ordem tinha que ser cumprida!. Dias e noites barbarizavam a mente do pobre sacerdote até que, numa madrugada, ele em oração suplicando a Deus uma luz nas trevas, eis que uma pedra cai em seu colo, sem antes estraçalhar a vidraça de seu quarto. Assustado a princípio,  passados alguns minutos sua mente e alma se iluminaram e, caindo de joelhos, em prantos, agradeceu a Deus a Sua mensagem, pois aquela pedra seria a primeira a ser empregada na construção do novo Templo.
         Em seus sermões em galpões improvisados, pequenas famílias se empolgaram com essa mensagem divina e a notícia milagrosa se espalhou aos quatro ventos e uma multidão se converteu.
         O formigueiro humano então se formou, homens, mulheres, velhos e crianças na ajuda à santa missão, aquela ordem episcopal.
              Corroído pelo remorso, aquele homem rude, autor da pedrada, procurou o padre, confessou seu pecado e, em lágrimas ofereceu seu trabalho, tornando-se um cristão, mais um pedreiro de Deus. Em pouco tempo os sinos repicavam saudando a nova Casa do Senhor.


                                     


              Dois amigos se encontraram em Jerusalém, às vésperas da Semana Santa e a conversa entre eles, naturalmente, se concentrava em torno de Jesus Cristo, Sua vida, a Via Sacra, o Golgota, a crucificação e outros assuntos.
          Um deles, católico fervoroso e outro, um famoso engenheiro incrédulo, duvidoso entre a materialidade e a espiritualidade da vida. Este contou ao amigo que tinha vasculhado todo o terreno pisado por Cristo e, com aparelhos sofisticados sondou e revolveu toda a terra da caminhada de Jesus, de Belém a Jerusalém, não encontrando prova alguma de Sua existência divina.
          O amigo piedoso ainda tentou argumentar mas ele não se convenceu. Despediram-se, era véspera da Sexta Feira da Paixão.
           Tomado de grande espanto o homem piedoso ficou estático com a cena que se deparava a sua frente:... suando em bicas, “flagelado” pelos centuriões romanos, estava lá o engenheiro, simulando Cristo, carregando a Cruz nas ruas estreitas à Caminho do Calvário.
         Finda a Via Crucis, o engenheiro banhado em lágrimas, esfalfado e desfalecido abraçou o amigo confessando: as palavras vãs de ontem nada valem, o que vale é ter Jesus em meu coração.



                                                   

                             Quantas Divisões tem o Papa?

                                                                        Na organização de um Exército,
uma Divisão tem o efetivo
 de aproximadamente 
15.000 combatentes.
           

           Era o dia 5 de março de 1953. Entusiasmados, assistíamos a mais uma conferência do agora Monsenhor Benedito Calazans, na época considerado o maior orador sacro da igreja católica de São Paulo. Diga-se de passagem que Calazans tinha sido nosso professor de Ética na antiga Escola de Oficiais da Força Pública.
           Já terminando a bela conferência, o padre Godinho, seu amigo (Godinho era Deputado Estadual e Calazans  Senador da República, ambos pela UDN) lhe dá a notícia da morte de Stalin, que havia assumido o poder da União Soviética, sucessor de Lenine, o Chefe da Revolução Bolchevista de 1917.
           O Senador emudece, seu olhar vago, palidez em seu rosto, segundos de meditação. A situação deveras traumática... Stalin, o chefe do comunismo, o homem de aço, o matador de milhões de russos brancos, o construtor do muro de Berlim, o responsável pela Guerra fria... estava morto!
           Voltando do êxtase, Calazans nos olha fixamente, domina a plateia e nos conta que, no início da Segunda Grande Guerra Mundial (1939-45), em uma entrevista fora ressaltada por um jornalista a posição do Vaticano, ferrenhamente contrário aos ditames do comunismo ateu. Stalin, extravasando todo seu ódio respondeu:

                                 Quantas divisões tem o Papa?!

            Altaneiro, numa postura espartana, o Senador Calazans vibra e nos fala, terminando sua conferência: a estas horas Stalin está sabendo quantas divisões tem o Papa!.


                    Calazans faleceu aos 95 anos, todos eles dedicados à Pátria e a Cristo.