Boa leitura!

domingo, 6 de dezembro de 2015

O CONSELHO DO GOVERNADOR

          Conta-se que certo Governador recebeu, em seu Palácio, um parente, que pretendia seguir a carreira política. Trouxe do interior uma carta de apresentação do Presidente do Partido, recomendando, ao Chefe do Governo, que o indicasse candidato a Vereador na Capital, nas próximas eleições.
         Acolheu o moço carinhosamente, perguntou de seu pai, primo e amigo, também de sua mãe e conversaram durante horas sobre diversos assuntos, até que, lendo aquela missiva, encarou o rapaz e, num tom muito sério esclareceu não ter condições de entrar na carreira política, por uma questão grave, seu pai era um bêbado, sem-vergonha e ladrão e sua mãe não tinha boa conduta moral, constando ter vários amantes, e foi por aí afora, com sua linguagem amarga contra a família de seu primo.
         O rapaz, brioso, não aguentou tantos desaforos, avançando furiosamente contra o Governador, tentando esbofeteá-lo, mas os ajudantes de ordem, prevenidos carregaram-no para uma sala ao lado.
         Passadas algumas horas, foi trazido ao gabinete, assustando-se quando o Governador o abraçou efusivamente, dizendo-lhe: “Meu querido sobrinho, você não pode ser político, porque nós temos que ouvir todas essas imprecações, todo esse desaforos, acusando-nos uma hora de ladrão, outro de homem traído (corno), ou o que é pior, de gay. Meu menino me perdoe, sua mãe é uma santa, seu pai é honesto, conduta ilibada, é um varão de alta linhagem. Volte para sua terra, recomende-me aos seus pais, meus caríssimos primos e escute o meu conselho: Escolha uma outra destinação, outro objetivo e conte comigo, farei tudo para ajudá-lo, agora, para política você não serve”.



quinta-feira, 26 de novembro de 2015

ROCAM


No último dia 24 de Agosto a Câmara Municipal e Associação Comercial de São Paulo comemoraram o Dia Internacional do Motociclista. Para tanto, numa cerimônia ocorrida na própria Câmara, foi homenageado o Coronel PM Pedro Rezende de Oliveira Mello como digno representante dessa classe notável de pessoas mundo afora.
O Coronel Mello em 1990, como comandante da escolta de Batedores do Palácio do Governo de São Paulo, iniciou uma cruzada no sentido de levar para o policiamento ostensivo, a motocicleta como veículo de patrulhamento, assim como era empregada em inúmeros países do mundo.
Após três anos de várias tentativas com o apoio de seu comandante Coronel Vianna, conseguiu apresentar seu projeto com o tipo de motocicletas e motociclistas em questão ao Exmo. Sr. Governador de Estado, que de imediato aprovou a ideia e deu aval para a criação desta especialidade.
Nesta época, eclodiu em São Paulo, enorme atividade de roubo a bancos, dificilíssimo de combater pelo trânsito caótico da capital, fator este que exigiria veículo de perseguição que não sofresse os congestionamentos do trânsito e a moto é o veículo ideal para circulação neste caso.
O Coronel Mello iniciou esse trabalho com a seleção por aptidão vocacional do efetivo que comporia a ROCAM nome escolhido pelo comando da PM para este órgão.
Enquanto se instalava o processo de aquisição de 100 motocicletas e 10 viaturas de apoio, foi dado o início ao mais intensivo curso teórico policial e prático motociclístico em várias modalidades como patrulhamento, escolta, esportivo de motovelocidade, moto cross e trial, para habilitar seus condutores com as técnicas mais modernas de pilotagem, para melhor desempenho e segurança dos mesmos. Isto foi possível porque o Coronel Mello competia em todas estas modalidades. Este curso, o mais longo efetuado na Polícia Militar, durou três meses. Foi tão perfeito que por quase um ano não houve acidentes com estes PMs.
Esta formação foi fundamental para que décadas depois a Corporação, no Estado inteiro, tenha recebido este serviço, sendo hoje a segunda maior frota do policiamento e que provavelmente assuma em algum tempo, pelo seu custo-benefício e sucesso na atividade-fim, venha se tornar, a base do rádio patrulhamento em São Paulo e até em outros estados.
Por isso o Coronel Mello foi agraciado com o Marco Mundial da Paz e com o diploma referente a data pela Câmara Municipal e Associação Comercial.
Como se percebe o mundo da motocicleta, ainda pouco explorado em diversas atividades profissionais, pode trazer ótimos resultados para a sociedade. Só resta imaginar quantas vidas salvas e meliantes encarcerados a ROCAM providenciou, o que, de certa forma, justifica este maravilhoso reconhecimento da sociedade.


NOTA: Esta transcrição me emociona! Parabéns meu querido filho, você sempre carreou, para seu pai, momentos de alegrias e incontido orgulho.

domingo, 8 de novembro de 2015

SANTO EXPEDITO. BENDITO SEJA!

Em plena Segunda Grande Guerra Mundial, foi criada a Capelania Militar da antiga Força Pública, pioneira no Brasil, sendo nomeado primeiro Capelão o padre Paulo Aurissol Cavalheiro Freire, ostentando, orgulhosamente, no ombro, sobre a batina preta, o galão de 2º. Tenente.

Pensou, o Tenente Aurissol, o que fazer? Era urgente ter um templo, uma igreja, uma capela, um espaço material para consolidar a grandeza da obra espiritual.

De pronto, apresentaram-se ao Capelão um Engenheiro e um Arquiteto, este o então Tenente Nelson Brotto e aquele, o Doutor Ignácio de Anhaia Mello, que imediatamente lançaram a pedra fundamental da sonhada igreja, que seria batizada de “Santo Expedito”, homenageando o Centurião Romano, Comandante da Cavalaria Expedita dos Exércitos de Julio César.

Ao Tenente Nelson Brotto coube a execução da obra, mas não havia verba para tal. O que fez então o nosso arquiteto Brotto? Conseguiu de seus colegas do Instituto de Engenharia, centena deles, a doação de todas as sobras de material de suas construções (tijolos, telhas, madeirames, material elétrico, tubulações, enfim tudo o que interessava para a construção do templo).

A mão de obra conseguiu com o Diretor da Casa de Detenção, na época situada na Avenida Tiradentes. Todas as manhãs, pessoalmente, o Tenente Brotto “escoltava”, sozinho, uma vintena de detentos, capacitados em todas as modalidades de construção. No fim da tarde era a volta para o corretivo penal, sempre acompanhado pelo nosso tenente, que granjeou amizade e a admiração dos presos. Nesse exercício diário, por meses a fio, talvez anos, muitos presidiários se regeneraram e adotaram Cristo em seus corações.

Imponente, aí está a nossa Capelania Santo Expedito, obra do Dr. Anhaia Mello, já falecido há muitos anos, o padre Aurissol também. O Tenente Brotto faleceu recentemente, sendo absolutamente certo que todos eles estão na Eternidade, na bemaventurança de Deus.
Na missa de 7ª. Dia de meu amigo Coronel Brotto, meu irmão, meu colega da Academia de Policia Militar do Barro Branco, lembrei que ele era uma referência, figura emblemática em nossa querida Corporação. Homem inteligente, com invejável cultura geral e profissional, eclético por excelência. Seu coração era bondoso com os homens e com os animais.
Discípulo de São Francisco de Assis, recolhia, das ruas, cachorros, gatos e outros animais famintos e doentes, levava-os para a sua casa para alimentá-los e curar suas feridas. Tinha uma paixão especial para com os cavalos, repetindo sempre, em todos os livros que escreveu, e foram muitos, que todos os animais são suspiros de Deus mas, o cavalo é o seu devaneio.


Padre Aurissol Cavalheiro, Engenheiro Anhaia Mello e Arquiteto Nelson Brotto, benditos sejam! Santo Expedito, mil vezes Bendito seja!

terça-feira, 28 de julho de 2015

SEMANA EUCLIDES DA CUNHA

A crônica deste mês é sobre a Semana Euclides da Cunha, que se realiza, todos os anos, no mês de agosto, em São Jose do Rio Pardo, homenageando o grande escritor e sua famosa obra literária OS SERTÕES.

Esse acontecimento atrai brasileiros e estrangeiros, admiradores de Euclides da Cunha e de seu livro, traduzido em todos os idiomas do mundo.

A cada ano, a Semana é enriquecida, pois veem à luz, sobre o magno evento, novos temas, diálogos, críticas, discussões, discursos, conferências, filmes, etc... que somam à já grandiosa literatura sobre o apaixonante assunto. O leitor, naturalmente curioso, perguntará: Por que a Semana ser realizada em São José do Rio Pardo, sendo Euclides da Cunha fluminense, nascido no município de Cantagalo?

Antes de responder, quero dar a notícia de que a bela cidade de São José do Rio Pardo é terra natal do nosso amigo Maj. Dércio Chiconello, brilhante jornalista, redator do nosso “Clarinadas da Tabatinguera”.

Vamos aos fatos. Euclides da Cunha desligou-se do Exército, em fins do século XIX, onde servira como 1.º Tenente. Mudou-se para São Paulo, sendo contratado para ir à Bahia, como correspondente do jornal “O Estado de São Paulo”, para cobrir toda a Guerra de Canudos (1897).

Essa Guerra ou Campanha deveu-se a Antônio Conselheiro e seus jagunços. Pensava-se, na ocasião, que o Conselheiro fosse o chefe de outra Rebelião, para derrubar a Novel República, assustadas que permaneciam as autoridades federais com a Revolta da Armada de 1893, cujos líderes desejavam a volta de D. Pedro II. O Conselheiro e seu Bando sempre repetiam o nome do Imperador nas frequentes procissões de cunho religioso.

Suas primeiras vitórias carrearam à região milhares de nordestinos, fanatizados pelo novo Messias, que pregava a luta até a morte, porque no Paraíso os rios são de leite e os barrancos de rapadura. Com essa crença mística, os simples jagunços se tornaram guerrilheiros incomparáveis, enfrentando os canhões e rajadas de metralhadoras das tropas governistas, convictos de que, morrendo, teriam a recompensa divina.



A OBRA


OS SERTÕES, obra de imenso valor, foi traduzido em todos ou quase todos os idiomas do mundo, projetando o nome do Brasil e de seu grande escritor Euclides da Cunha.

Em março de 1897, escreveu o seu primeiro artigo para o jornal O Estado de São Paulo, intitulado “A Nossa Vendéia”, relacionado com a campanha de Canudos. Comparou Antônio Conselheiro e seus jagunços aos camponeses católicos da região da França (Vendéia), fieis ao Rei Luiz XVI, contra os jacobinos da Revolução Francesa de 1789. Escreveu outros artigos, guardou-os para um futuro livro. 

Em 1899, Euclides vai a São José do Rio Pardo para, como engenheiro, reconstruir uma ponte metálica, caída durante uma enchente. Levou consigo toda documentação sobre Canudos, todo o seu diário de campanha. À beira do Rio Pardo construiu uma cabana, cobertura de zinco e, nas horas de folga e de inspiração, escreveu a monumental obra que foi lançada em 1902 com grande êxito de críticas e vendas.

O livro foi estruturado em 3 partes: A Terra, O Homem e A Luta.


A TERRA


É a descrição da terra, feita pelo grande escritor, detalhando todas as características da região, sua geografia e sua geologia. Descreveu, com maestria, o solo, a flora e a fauna, enfocando a seca como a maior das calamidades para os nordestinos.

Ele praguejou a terra, barbaramente estéril, exaltando-a como maravilhosamente exuberante quando, com um pouco de chuva, aquele deserto medonho se transformava, as matas se cobrindo de verde, alegrando a alma do sertanejo.


O HOMEM


“O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral...”

Neste capítulo, Euclides da Cunha foi um sociólogo e um antropólogo. Descreveu o sertanejo e sua relação com a terra, com o meio, sua gênese, seu comportamento, crença, uso e costume. Sobre Antônio Conselheiro, o líder das caatingas, apresentou o seu passado, o seu caráter e como era a sua vida nas andanças místicas. 

As duas partes A TERRA E O HOMEM, minuciosamente descritas, são o grande palco onde entrarão os personagens para o grande espetáculo, a guerra que não devia ter acontecido, verdadeiramente um genocídio.


A LUTA


Em 1893, o governo da Bahia mandou uma Companhia para limpar a região, pois o pregador já atemorizava os moradores das caatingas. Conselheiro e seus homens desbarataram a tropa do Cap. Vergílio Pereira de Almeida, da Força Pública baiana.

O governo federal, preocupado com a ordem social ameaçada e o perigo de restauração da Monarquia, organizou uma expedição militar para vencer os amotinados. Essa expedição é derrotada. Mais duas, a 2.ª e 3.ª expedições também são derrotadas, ficando todo o material bélico em poder dos jagunços. 

Somente a 4.ª expedição logrou êxito.



Vejamos a constituição dessas quatro expedições militares:


Em 1896 – 1.ª Expedição – do Exército, comandada pelo 1.º Ten. Pires Ferreira – efetivo 107 praças. Foi completamente desbaratada e todo o armamento ficou em poder dos jagunços.

Em 1897 – 2.ª Expedição – do Exército e Força Pública da Bahia, comandada pelo Maj. Febrônio de Brito – efetivo 506 homens munidos de metralhadoras e dois canhões Krupp – completamente vencida e todo o armamento apreendido.

Em 1897 – 3.ª Expedição, mês de março – do Exército e Força Pública da Bahia – composta de Infantaria, Cavalaria e Artilharia – comandada pelo Cel. Moreira César – efetivo 1.300 homens – completamente batida – idem quanto ao material bélico.

Em 1897 – 4.ª Expedição – do Exército e Forças Públicas de vários Estados (de São Paulo, o 1.º BI – hoje 1.º BPM/M “Tobias de Aguiar”) – efetivo 14.000 homens das Três Armas, comando do Gen. Arthur Oscar.

O Arraial de Canudos foi completamente destroçado, mas foi triste o balanço da Guerra: 25.000 mortos (Legalistas e Revoltosos). A Campanha foi um episódio glorioso da Nação ou foi um erro, um genocídio? O próprio Euclides da Cunha, que chegou à região deflagrada, dando Vivas à República e morte a Antônio Conselheiro, se convenceu depois que a guerra não deveria ter acontecido contra aqueles pobres nordestinos, sofridos nos campos áridos daqueles sertões.

Como vimos, na 4.ª Expedição, o nosso 1.º Batalhão de Infantaria (hoje o 1º. BPM/M) lutou heroicamente. Vejamos o desempenho da tropa paulista, extraído dos escritos de Euclides da Cunha e da sua obra Os Sertões:

“A 1º de agosto de 1897, o 1.º Batalhão de Infantaria, da então Força Pública, rumou às terras da Bahia, fazendo o trajeto até Santos por via férrea. De Santos a Salvador a bordo do Vapor Itaituba.

A chegada à capital baiana deu-se a 7 de agosto e a partida, para o requeimado sertão no dia 9, percorrendo o Batalhão o itinerário Salvador-Queimadas, Queimadas-Monte Santo e Monte Santo-Canudos.

Em Monte Santo, chegou a 23 de agosto, desfilando garbosamente pelas ruas da cidade, ao som de marchas militares, surpreendendo autoridades e o povo, pois a apresentação era impecável, em que pesassem 100 quilômetros de deslocamento estafantes.

Incorporado às Forças em operação, recebeu a missão de escoltar até Canudos um comboio de víveres e munições, mais ainda dezenas de muares e 700 cabeças de gado para o abastecimento da tropa. Nenhuma dessas caravanas tinha conseguido chegar intacta ao Arraial de Antônio Conselheiro, pois os fanáticos atacavam sempre, desbaratando-as e apoderando-se da preciosa carga“.



Euclides da Cunha, numa reportagem de 2 de setembro, assim se referiu:


“O Batalhão Paulista, escoltando um comboio, foi atacado nas proximidades de Canudos. Repeliu o inimigo, sem perder um só homem e sem deixar extraviar uma só rez ou muar do rebanho. Foi recebido com entusiasmo pelas forças em operação.

O Batalhão era perfeito na disciplina. Cumpria todas as ordens que recebia, rigorosamente, e estritamente com uma precisão verdadeiramente militar; arriscadíssimas e sérias foram muitas vezes as posições que ocupou e não abandonou.

Mas não era a primeira vez que os Paulistas se aventuraram a arrancadas nos sertões. O Batalhão de São Paulo, heróico e desassombrado no combate, fez reviver, por um momento, numa página da história do presente, todo o vigor guerreiro e toda a índole varonil dos valentes Bandeirantes.

No dia 25 de agosto, o Batalhão entrou em operação de guerra, tomando parte em violentos combates. A 9 de setembro, duas Companhias foram destacadas para guarnecer a estrada do Calumbi, posição chave para as comunicações da linha de frente com a retaguarda, ponto vital de concentração do material bélico e de boca.

Os jagunços esperavam no Calumbi a chegada da expedição do Gen. Arthur Oscar, pois o terreno favorecia o assalto. A estrada ladeada pelas montanhas de Calumbi a Cachamingó, tendo um trecho de mais de 3 quilômetros em desfiladeiro, cortado pelos rios Sargento e Caraíbas. A tropa paulista repeliu valentemente o inimigo, apesar de suas cutilantes investidas.

A 25 de setembro, o Maj. José Pedro de Oliveira, comandando uma ala do Batalhão, recebeu ordens de atacar um grupo de trincheiras inimigas, na bifurcação da estrada de Uauá com Canudos. Foi um embate cruento de longas horas, tendo as tropas do Conselheiro batido em retirada, não resistindo às cargas cerradas, deixando dezenas de mortos e copioso material bélico.

Nesse combate os paulistas tiveram 6 mortos e muitos feridos, entre os quais o valente Maj. José Pedro de Oliveira que, mal refeito dos ferimentos, tomou parte com o Batalhão, a 30 de setembro, no combate decisivo contra Conselheiro e seus homens.

No assalto final ao reduto de Canudos, que só terminou a 5 de outubro, nas cargas e no corpo a corpo, o Batalhão Paulista perdeu mais 6 homens, lutando heroicamente, ao lado dos efetivos do Exército Nacional e das Forças Públicas da Bahia, Pará e Amazonas”.

O lendário Batalhão Paulista regressou a São Paulo, aqui chegando com dezenas de feridos a 26 de outubro, sendo recebido entusiasticamente pelas autoridades e pelo povo. A Bandeira Nacional, que defendeu na dura refrega, se encontra no Salão de Honra do Quartel da Luz, em cujo pátio se ergue, majestoso, o monumento em mármore, onde estão esculpidos os nomes dos 12 mortos paulistas na cruenta guerra.



EUCLIDES DA CUNHA


Euclides da Cunha nasceu a 20 de janeiro de 1866, no município de Cantagalo, Estado do Rio de Janeiro. Assentou praça na Escola Militar em 1886, visando a engenharia militar, tendo sido aluno de Benjamim Constant, que pregava, aos seus discípulos, o positivismo e o ideal republicano.

Em dezembro de 1888, foi desligado da Escola Militar e do Exército, por ter cometido grave falta disciplinar, ao atirar seu sabre ao chão, numa ofensa ao Ministro da Guerra, que visitava os cadetes, para desmobilizá-los de participação na propaganda republicana.

Quando era acirrada na capital federal a luta para a Proclamação da República, Euclides da Cunha mudou-se para São Paulo, onde escreve veementes artigos no jornal “A Província de São Paulo” contra a Monarquia.

No dia 16 de novembro 1889 vai ao Rio, para participar das comemorações pela vitória republicana, na casa do Maj. Sólon Ribeiro. Nessa noite enamorou-se da filha do anfitrião.

A 19 de novembro foi reintegrado ao Exército e promovido a 2º. Tenente. No ano seguinte casou-se com Ana Sólon Ribeiro. Em 1892 , já 1º. Tenente foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Rio de Janeiro.

Em 1904 foi nomeado, pelo Itamarati, chefe da Comissão de Fronteiras, na Amazônia, regressando dois anos depois, sendo efetivado no Ministério do Barão do Rio Branco. Publicou livros: O Alto Purus, Contrastes e Confrontos e Peru Versus Bolívia.

Em 1909 foi nomeado professor de Lógica no Colégio D. Pedro II, marcando a tragédia de Piedade.

No dia 15 de agosto, um domingo chuvoso, no bairro carioca de Piedade, numa troca de tiros com o Cadete Dilermando de Assis, amante de sua esposa, morre Euclides da Cunha. Velado na Academia Brasileira de Letras, sepultado no dia 16, no Cemitério São João Batista, em Botafogo, no Rio de Janeiro.

Anos mais tarde, seu filho, Euclides da Cunha Filho, o Quindinho, Aspirante a Oficial, quis vingar a morte do pai. Também foi morto pelo Cap. Dilermando.

No dia 15 de agosto de 1982, os restos mortais de pai e filho foram trasladados para o mausoléu, em São José do Rio Pardo, à beira do rio, ao lado da cabana, onde veio a luz a extraordinária obra OS SERTÕES. 

terça-feira, 9 de junho de 2015

CURIOSIDADES


A Saudade

(Crônica de Guilherme de Almeida escrita a bordo do Navio “Siqueira Campos” que levava os exilados para Portugal)


Não há mulheres a bordo? Há! Viaja conosco uma passageira clandestina, de volta a Portugal, seu país de origem. Vive toda e sempre escondida. Nem a oficialidade, nem o pessoal de bordo, nem os agentes de polícia que nos espiam, nem a escolta que nos inveja – ninguém, ninguém notou ainda a sua presença entre nós, na prisão flutuante.

E, no entanto, ela está por toda a parte. E ela divide, a clandestinidade, por todos nós, o seu carinho santo, com a piedade generosa de um irmã de caridade. Vai, de cabine em cabine, de mesa em mesa, de pensamento em pensamento. Senta-se no beliche, maternalmente, à cabeceira daquele que a insônia atormenta, e repete o gesto antigo que cobriu como numa asa, o nosso berço; apoia-se como uma cruz suavíssima, ao ombro daquele que, sentado num rolo de cordas da popa, finge olhar o crepúsculo exangue; debruça-se sobre o que escreve ou o que lê, e conduz a mão sobre o papel, ou volta às páginas do livro.

Quando ela veio de Portugal, era loira e leve: parecia a “velida” de D. Diniz, a “bem talhada”, a “delgada”, a “muito alongada da gente”, bailando “solo verde ramo florido...mas aqui, nos trópicos americanos, queimou-se de sol e amolentou-se no balanço das redes e das palmas.

E eis, agora, regressa mais lânguida e mais humana à sua pátria...

Viaja conosco uma passageira clandestina de volta a Portugal, seu país de origem. Ela é a Saudade!



Sete de Setembro

Dia da Independência
“Adversários, mas não inimigos”


Às sete horas de uma fulva manhã, estava todo o nosso QG nos esporões do Morro do Canhão. A Bandeira Brasileira foi hasteada no centro e no ponto mais alto das linhas. Um pelotão de combatentes subiu em cima das trincheiras na posição mais exposta ao fogo inimigo. Ao lado, formaram, em continência, todos os oficiais do comando.

O inimigo emudeceu como uma onça magnetizada por um foco de luz. Depois, atônito, impulsionado por uma por uma ordem irresistível, se pôs também de pé, no alto de suas posições, ao longe.

Enquanto isso a bandeira subia e os clarins cantavam.

Os seis quilômetros que podíamos ver de nossas linhas alçaram-se nas cristas e uma ordem geral que ninguém deu, mas todos ouviram e obedeceram. As trincheira ficaram de pé, ao sol!

E a Mantiqueira viu dois exércitos adversários interromperem a batalha e a prestar continência à mesma Bandeira que só um deles desfraldou. O Pavilhão chegou ao alto, tremulando. Os clarins pararam. O Capitão Saldanha deu a voz de descansar armas, mas o inimigo, voltado a si, quis comemorara liberdade a seu modo. Uma rajada grunhiu ao longe e assoviou sobre o nosso grupo, ainda no alto das trincheiras.


                                          

domingo, 31 de maio de 2015

REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA 1932



A Constituição de 1891, que até então regia os destinos da Nação, foi derrotada, implantando-se um governo discricionário, quando Getúlio Vargas assumiu o poder a 24 de outubro de 1930.

Seus primeiros atos foram substituir os governos dos Estados, nomeando Interventores de sua confiança, influenciado pelo “Clube dos Tenentes”, um grupo militar de “exaltados”, que desde 1922 procurava atingir postos de mando. Apareceram, então, os ex tenentes Juarez Távora, Filinto Muller, Juraci Magalhães nos cenários político-administrativos de Pernambuco, Mato Grosso, Bahia, respectivamente e, em São Paulo, o Interventor João Alberto Lins de Barros.

O General Miguel Costa, acumulando as funções de Secretário da Segurança Pública e Comandante da Força Pública, desentendeu-se com seu subordinado de véspera, o agora Interventor João Alberto, nascendo dentro da Corporação muitos ressentimentos, que culminaram com o movimento denominado Abrilada, a luta de Oficiais dos Batalhões da Capital (a maioria Tenentes) contra o Miguelismo.

Foi o primeiro grito dentro dos nossos quartéis, a 28 de abril de 1931 que, como uma bola de neve, apaixonaria os líderes civis e a opinião pública.

São Paulo exigiu de Getúlio um governo civil e paulista. Na voragem das paixões foi nomeado, o Dr. Plínio Barreto, que não pode assumir o governo, por desentendimento com o General Miguel Costa. Em seu lugar foi nomeado o grande jurista Laudo de Camargo, que em novembro de 1931, não podendo governar, pois as ordens vinham do Catete, não podendo nem mesmo nomear seus Secretários, exonerou-se a pedido.

Tomou as rédeas do governo o general Manoel Rabelo, que continuou a cercear a autonomia bandeirante. 

Na tentativa de conciliação, foi nomeado Interventor Federal o Embaixador Pedro de Toledo, mas o estado de coisas permaneceu o mesmo, São Paulo continuando a ser uma terra conquistada.

Em fevereiro de 1932, os partidos políticos se uniram e, inspirados pelo povo, pela mulher integrada na Liga da Defesa Paulista Pró-Constituinte e pelos estudantes de Escolas Superiores, formaram a FRENTE ÚNICA, com a finalidade de exigir a constitucionalização do país, apoiada por políticos de outros Estados, principalmente pelo Rio Grande do Sul, nas pessoas do Governador Flores da Cunha, Borges de Medeiros, Batista Luzardo, Raul Pila, Lindolfo Color, João Neves de Fontoura, e outros. Os políticos de Minas Gerais e o Governador Olegário Maciel também apoiavam São Paulo.

A 21 de maio de 1932, chegou a São Paulo o Dr. Osvaldo Aranha, enviado por Getúlio Vargas, para “resolver o caso paulista”. Em desagravo, a Frente Única lançou um veemente manifesto, no qual convidava o povo para um grande comício, terminando: ”Eia, pois, povo de São Paulo! É chegada a hora de libertação e vitória”. Foi um brado de guerra, a mole humana visitando os Quartéis-Generais do Exército e Força Pública, convidando os militares a solidarizarem-se naquele apelo de liberdade.

Na caminhada histórica, em frente ao Quartel General da Força Pública (Avenida Tiradentes) a Cavalaria Miguelista interveio, ferindo muitos estudantes, aparecendo então a figura impoluta do grande Tribuno Ibrahim Nobre que, inflamado, verberou, na presença do Interventor: já começa a correr o sangue paulista. Estamos algemados, dentro de uma senzala. E V. Ex., Dr. Pedro de Toledo, está preso conosco. V. Ex. deve sair dela e com estes homens vir às ruas reivindicar a nossa liberdade. V.Exª. está no fim da vida e deve escolher: um simples epitáfio ou uma estátua.

A 23 de maio, o entusiasmo chegou ao auge. Pedro de Toledo reconquistou sua autoridade e nomeou o Secretariado de São Paulo. Foi um delírio do povo bandeirante que aclamou o novo Governador e, dando vasão a essa grande conquista, se dirigiu ao centro da cidade para novos arrebatamentos e ao passar pela Praça da República foi “metralhado” por simpatizantes da Ditadura.

Consumou-se então a tragédia, que sensibilizou todas as consciências livres, marcando o calendário cívico da sigla MMDC – Euclides Miragaia, Mario Martins de Miranda, Dráusio Amadeu Martins e Antonio Camargo de Andrade, os estudantes mortos em holocausto a uma grande causa.

O movimento, apaixonando todas as classes sociais, daí por diante, criou uma mística tão forte que evoluiu para um verdadeiro fanatismo cívico, desencadeando a 9 de julho a Revolução Constitucionalista, assumindo o comando geral das tropas os Generais Izidoro Dias Lopes e Bertoldo Klinger.

Os voluntários civis acorreram em massa, formando aproximadamente setenta Batalhões.

Um Corpo de Exército seguiu para o Rio de Janeiro, detendo-se, por grave erro, em Queluz, pois se tivesse avançado até a Capital da República, encontraria o entusiasmo do povo carioca e a guarnição ali sediada não lhes faria resistência, pois o consenso geral reivindicava a democracia para o país.

Foi grandioso e comovente o esforço de guerra dos paulistas, dos brasileiros e estrangeiros aqui residentes, em torno do ideal constitucionalista.

Construíram-se carros de assalto, tanques de guerra e trens blindados.

No parque industrial, fundiram-se matrizes para a produção de capacetes de aço, morteiros, bombardas, bocais para lança-granadas, lança-minas, peças bélicas de reposição, bombas para aviões, granadas de obuses e de mão.

O trabalho da mulher paulista foi notável, respondendo sempre presente, com entusiasmo cívico, em todas as atividades, para que não faltasse aos soldados o fardamento, a alimentação, o tratamento nos hospitais e nas frentes de combate, assistindo também as famílias necessitadas.

Na campanha do ouro, a mulher paulista abdicou de suas jóias de estimação, oferecendo a própria aliança para o bem de São Paulo e do Brasil.

Perfeitamente integradas com os objetivos da Revolução, a Força Pública e Guarda Civil ajudaram São Paulo a escrever a epopéia sem precedentes na História do Brasil, que representou a força da alma livre do bandeirante, lutador indômito em prol de nobres e alevantados ideais.

Obedientes ao governo do Estado, cumpriram, desde a primeira hora, a ordem de mobilização, colocando-se à disposição do comando da Região Militar, a quem coube as operações do Exército Constitucionalista.

A Força Pública, apesar de enfraquecida pelas revoluções anteriores, desfalcada em 1930 de sua artilharia, a aviação e outros apetrechos bélicos, mesmo assim, se rearticulou militarmente e, revigorada, lutou em todos os setores, adestrando também milhares de novos soldados, formando oficiais e graduados de emergências para mais de 70 Batalhões Patrióticos.

Após três meses de luta em todas as frentes, quando os contratempos da guerra impuseram sucessivas retiradas, com munição escassa, ainda assim, sua atuação foi destacada, sustentando cruentos combates, valendo-se muitas vezes da matraca, à guisa de engenho de guerra.

No Monumento Mausoléu de 32 do Ibirapuera dormem os mortos o sono eterno do idealismo paulista. O maior quinhão coube à Força Pública e entre os mártires, o seu Comandante Geral, o bravo General Júlio Marcondes Salgado.

A luta foi heróica. Perdemos a guerra, mas a vencemos moralmente, pois a Constituição chegou em 1934, reabrindo-se o Congresso, as Assembleias Legislativas dos Estados e as Câmaras de Vereadores nos Municípios brasileiros. Em 1937, Getúlio outorgou a Constituinte “Polaca” e governou o Brasil, como Ditador, até 1945. Em 1950, ele foi eleito Presidente da República, mas não soube governar com o Congresso, com o mar de lama embaixo do Catete, com a hostilidade da República do Galeão e com a oratória devastadora de Carlos Lacerda. Suicidou-se em agosto de 1954.


quarta-feira, 13 de maio de 2015

2.ª GUERRA MUNDIAL

A 8 de maio de 1945 terminou a
Segunda Grande Guerra Mundial,
há setenta anos portanto...



Na capitulação de 1918, derrotada militarmente na 1.ª Grande Guerra, humilhada, perdendo na Europa a Alsácia-Lorena e a Prússia Oriental e também despojada de suas possessões ultramarinas, a região industrial do Reno ocupada, suas forças armadas reduzidas ao mínimo, obrigada a pagar altas indenizações, sua moeda em colapso, desemprego em massa, assim estava a Alemanha, quando Adolf Hitler apareceu no cenário político.

Falando da opressão dos vencedores, grandeza nacional, superioridade da raça ariana, denunciando os judeus e os comunistas, Hitler fundou o Partido Nazista, capitalizando o orgulho ferido de seus compatriotas.

Rearmando de forma espantosa suas forças armadas, já em 1936 expulsou os aliados do Reno. Aliando-se a Mussolini, o eixo Roma-Berlim formado, Alemanha e Itália mandaram suas tropas para ajudar Francisco Franco na Guerra Espanhola, esse ato constituindo a oportunidade para testar suas novas armas e uma nova estratégia, a guerra de movimento.

Hitler precisava de espaço vital para tornar a Alemanha a primeira potência mundial. Avançou então contra a Áustria e Checoslováquia em 1938 e, quando suas forças invadiram a Polônia no ano seguinte, França e Inglaterra protestaram, irrompendo a 1.º de setembro a 2.ª Grande Guerra Mundial.

Alemanha e Itália se uniram ao Japão, formando as forças do Eixo Roma-Berlim-Tóquio uma poderosa máquina de guerra para a dominação do mundo.

Apesar dos êxitos iniciais, essas três nações totalitárias acabaram derrotadas em 1945, depois de muita carnificina e devastação, pelas forças dos países democráticos, entre estes o Brasil.

O governo brasileiro, nos primeiros anos da conflagração, manteve-se neutro, numa posição de equilíbrio, entre as grandes potências em conflito, segundo a política externa de Getúlio Vargas, acusado muitas vezes de germanófilo.

Com a entrada dos Estados Unidos na guerra, em 1941, sofrendo pressão das Nações Aliadas, o nosso governo rompeu relações com a Alemanha e a Itália, no começo de 1942 e, em agosto desse ano, em conseqüência do torpedeamento de nossos navios mercantes por submarinos alemães, foi declarado estado de guerra contra aqueles dois países e mais tarde também ao Japão.

A 23 de novembro de 1943 foi criada a Força Expedicionária Brasileira, com o efetivo de 25.334 homens, comandada pelo General João Baptista Mascarenhas de Morais. Depois de muitos preparativos, os Expedicionários do Brasil foram transportados para a Itália, tendo sido o primeiro escalão embarcado a 2 de julho de 1944, subordinando-se ao 5.º Exército dos Estados Unidos.

Juntamente com a FEB seguiu o Grupo de Caça, esquadrão aéreo composto de 442 homens e 28 aviões P-47 Thunderbolt.

Demonstraram os nossos pracinhas o valor do soldado brasileiro nos campos da Itália, vitoriosos nas batalhas de Montesi, Castelnuovo di Garfagnana, Monte Castelo, Vale do Pó. Em Fornovo rendeu-se a 28 de abril a 148.ª Divisão Alemã, sendo aprisionados 14.779 soldados inimigos.

Durante o conflito, nossa Polícia Militar participou, ativa e eficientemente, em duas frentes:

Interna – em postos de vigilância no Parque Industrial de São Paulo, alto da serra, represas da Light, no litoral, em zona de concentração de imigrantes dos países inimigos e em guardas de navios e de presos estrangeiros, a cargo da Força Pública.

Externa – na Itália com um efetivo de setenta e nove homens da Guarda Civil (*), para a missão de Polícia Militar, integrado à Força Expedicionária Brasileira. Esse pelotão deu inicio à Polícia do Exército, (PE).

quarta-feira, 15 de abril de 2015

AS NEVES DO KILIMANJARO

Kilimanjaro é a maior montanha
da África, com 7.000 de altura,
situada na Tanzânia, 
a leste do Continente


Na deposição de Jango Goulart, em 1964, eu estava no Comando Interino do 3º BC, na bela cidade de Ribeirão Preto. O dia 31 de março foi de alegria geral, as Forças Armadas elogiadas pela família brasileira, pois elas tinham vencido o mal, frustrando as intenções do Presidente Jango, que era jogar o Brasil para o regime de esquerda, avesso à índole das nossas gentes.

A ação heroica dos militares e do povo foi batizada como A Revolução Redentora de 31 de março, data comemorada por muitos anos em solenidades cívicas e militares mas infelizmente foi proibida, se não me engano, pelo Presidente Lula.

Deixemos a história de lado e falemos das Neves do Kilimanjaro, o tema destes escritos.

Residente em Campinas, pouca oportunidade tinha para a família, dado às contínuas prontidões, devidas àquele período turbulento de nossa Pátria (façamos justiça a Jango pois, com a sua fuga para o Uruguai, ele teria evitado uma possível guerra civil entre irmãos).

Num fim de semana, o país já pacificado, o General CastelLo Branco timoneiro da Nação, estava eu na Terra das Andorinhas, no feliz convívio com meus queridos, quando meu filho Pedrinho, de 15 anos, falou-me das Neves do Kilimanjaro, famoso filme que estava passando em um dos cinemas da cidade. Fomos assisti-lo.

Aconteceu que a Casa de Espetáculos estava lotada, todos os lugares ocupados. Vagamos pelo salão todo e nada, nada de assentos vagos. Foi quando divisei, o filme já em andamento, duas cadeiras revestidas de pano branco com a inscrição “Polícia”.

Raciocinei ... sou Major da Força Pública, minha Corporação policiando todo o Estado, então não titubiei, sentamos naquelas alvas e macias poltronas.

Não demorou muito, um lanterninha apareceu solicitando a nossa saída. Expliquei-lhe as minhas razões.

Depois de 10 minutos, um guarda civil se aproximou e, delicadamente, pediu-nos que deixássemos os lugares; mostrei-lhe minha identidade e ele, saudando-me militarmente, se retirou.

Algum tempo depois aproximou-se, arrogante, o gerente do cinema, intimando-nos deixar o local, com a ameaça de chamar a Polícia. Repliquei veementemente! 

As Neves continuavam a deslizar no telão e nós, meu filho e eu, nada de entendermos o que era aquele Kilimanjaro, preocupados com este novo filme em que éramos atores.

Meia hora de calma, eis que as luzes se acenderam, a rodada do filme parou e adentraram ao salão o Delegado, o gerente e um pelotão de Choque do 8.º Batalhão.

O Comandante Tenente Sendim me reconheceu, filho que era do Coronel Miguel Melchiades Sendim, querido colega da Turma de Aspirantes de 1944, a primeira a se formar no Barro Branco.

Uma voz de comando ecoou no salão... Pelotão Sentido! O Tenente Sendim, em seguida apresentou-se, obediente ao nosso regime castrense.

Depois dos cumprimentos, esclareci as razões do meu procedimentos ao Delegado que, dirigindo-se ao gerente do cinema, censurou-o por ter autorizado a venda de mais bilhetes do que os assentos e, entonando sua voz esclareceu que, em situações idênticas, emergenciais, as poltronas brancas poderiam ser usadas pelos dignos Oficiais da Milícia Paulista. O gerente sumiu de cena.

A convite da autoridade policial, saímos para o cafezinho campineiro, a plateia toda, atônita e curiosa, nos acompanhando. O Pelotão formado à frente do cinema, o Tenente Sendim novamente me saudou militarmente com a voz firme de comando: Pelotão Sentido!...

Finalizando, quero explicar aos queridos leitores o porquê desta narração ocorrida há mais de 50 anos.

Convidado pelo Diretor de Ensino da Academia de Polícia Militar do Barro Branco proferi, em começo de março próximo passado, uma palestra sobre a Aviação Militar da Força Pública (1913-1932) para os cadetes do primeiro ano daquela notável Casa de Ensino. Terminada a palestra, muitos deles solicitaram permissão para uma foto com o velho mestre. Senti-me feliz, orgulhoso com aquela demonstração de carinho dos jovens de hoje, futuros comandantes do amanhã da nossa querida Polícia Militar.

Um deles era o cadete Sendim, neto do Coronel Miguel Melchiades Sendim pai daquele Tenente que me salvou da “guerra”do Kilimanjaro em Campinas.

Confesso que já tive oportunidade, várias vezes, de assistir a esse filme famoso, mas tenho medo do reencontro com o humilde lanterninha, o disciplinado guarda civil, o simpático delegado e o arrogante gerente...

quarta-feira, 25 de março de 2015

CURIOSIDADES

- De 24 para 25 de dezembro de 1924, o 2° Batalhão, então em operações de guerra no Estado do Paraná, tomou parte no combate de “Rocinha”. Seus elementos receberam nesse dia, como alimentação, unicamente uma colher de açúcar (manhã) e uma caneca de café (à noite). Depois, somente no dia 25, às 2 horas da tarde, é que lhes foi distribuído o almoço, composto de feijão e carne seca – Que Natal!!!;


- O Cel. João Negrão, como tenente, integrou a primeira equipe de aviadores brasileiros que atravessou o Atlântico Sul, no Hidroavião “JAHU”, em 1927;


- A nossa Polícia Militar é detentora do recorde de cinco vitórias na corrida de São Silvestre;


- A Caixa Beneficente foi a primeira organização a praticar a previdência social no Brasil;


- A Escola de Educação Física da Polícia Militar é a terceira na América do Sul (depois do Chile e Argentina) e a pioneira no Brasil;


- O Pelotão de Escolta da Polícia Militar, conhecido como a Escolta do Governador, além de suas funções normais, participa também de competições esportivas, como corridas e MotoCross. Uma curiosidade dessas competições é a chamada: “Curva do Sargento” no Autódromo de Intergagos, nome decorrente de uma queda que ali sofreu, em 1952, o Sargento Paulo Sebastião, integrante do Pelotão de Escolta, durante a prova de 24 horas de motocicletas.



COLÉGIO MILITAR 



No começo de 1978, tivemos a alegria e o orgulho de assistir à inauguração do Colégio Militar da PM, obra dignificante, inaugurado pelo Exmo. Sr. Cel. Comandante Geral Arnaldo Bastos de Carvalho Braga.

A objetivação desse extraordinário empreendimento se deveu a toda uma equipe, liderada pelos coronéis Hélio Guaycuru de Carvalho, Jonas Flores Ribeiro e Bruno Éboni Bello, que, naturalmente, deram realidade a um sonho antigo da Corporação.

À guisa de curiosidade, transcrevemos um artigo do então Capitão Francisco Vieira Fonseca, publicado na revista Militia de 1948:

“A criação do Colégio Estadual “Brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar”.

“Fazendo destas colunas a nossa pequena tribuna, vimos apresentar à consideração dos senhores deputados da Assembleia Legislativa do Estado, e especialmente, ao camarada Capitão Dr. José Artur da Mota Bicudo nosso representante naquela Casa, uma sugestão prática para apresentação, discussão e aprovação de uma lei, visando criar o Colégio Estadual “Brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar”.

A justificação e artigos do projeto em apreço, dispensam quaisquer comentários em torno da justiça que se fará às famílias dos milicianos e funcionários civis do Estado, que forem sacrificados em serviço público.

É necessário oferecer aos filhos dos que servem à Força Pública, à Guarda Civil e à Guarda Noturna, ensino secundário suficiente para habilitação ao concurso de ingresso às escolas formadoras de quadros dirigentes dessas corporações, bem como garantir o mesmo ensino aos filhos dos que forem sacrificados em serviço público.

As entidades de classe, cujos elementos serão beneficiados com a execução da medida proposta e, especialmente, ao Clube Militar da Força Pública, solicitamos ventilar o assunto através de debates em suas sedes, enviando-nos as suas sugestões aditivas ou substitutivas, no sentido de aprimoramento do projeto. E, aos senhores deputados, solicitamos seu interesse por ele, já que tanto têm demonstrado em prol do amparo às famílias dos servidores públicos e à causa educacional em nossa terra”.

Trinta anos se passaram para a sublimação de um sonho. Parabéns aos idealistas de ontem e de hoje.



A CARREIRA



O primeiro Comandante Geral da Milícia, oriundo de suas próprias fileiras, foi o Tenente Coronel Guilherme José do Nascimento, nomeado interinamente em 13 de dezembro de 1889.

Antes, desde a criação da Guarda Municipal Permanente, em 1831, o Comandante era escolhido entre os oficiais superiores do Exército, ou Capitão com a graduação de Major; Os Comandantes de Companhia e ajudantes eram escolhidos, também, das quatro armas do E.N., ou dentre os oficiais honorários da Guarda Municipal. Eram requisitados pelo Presidente da Província, conforme Lei n°. 236, de 27 de fevereiro de 1844.

Com o passar dos anos, os elementos da Corporação foram conquistando o direito natural e justo de galgarem os postos do oficialato. Em 1852, pela Lei n°. 432, ficou estabelecido que poderiam ser nomeados para lugares de quartel-mestre, secretário, 3°.s Comandantes de Companhia (Alferes), os oficiais inferiores dos Permanentes, de bom comportamento e serviços distinguidos. No ano seguinte, a Lei n°. 452 autorizava a promoção dos 3°.s comandantes (alferes) a 2.°s comandantes (tenentes) e destes a 1.°s comandantes de companhia (capitães), sendo que o interstício seria de dois anos, elevado depois para três.

Assim, a carreira de oficial da PM atingia o posto de Capitão Comandante de Cia., ficando reservado ao Exército o suprimento dos altos postos, que eram os de Comandante do Corpo, de Ajudante e o de Mandante ou Fiscal.

Em 1881, nova conquista, pois nossos oficiais poderiam concorrer aos lugares de Fiscal e Ajudante, e somente o de Comandante de Corpo seria do Exército.

Em 1887, pelo seu Regulamento, o Corpo Policial Permanente seria, de preferência, comandado por oficial do E.N., o que não excluía a possibilidade de ser nomeado um oficial da própria milícia.

Essa possibilidade de um oficial nosso galgar todos os postos de hierarquia, até o de Comandante, foi homologada pela Lei n°. 27, de 10 de abril de 1888, entretanto, a Lei n°. 102, de 9 de abril de 1889, revogou em parte aquela, determinando que: ...”Para Comandante do Corpo Policial Permanente só poderá servir oficial do Exército, efetivo ou reformado”.

Com o advento da República, um dos primeiros atos do Governo do Estado foi a substituição do Comandante de Corpo, na ocasião, o Capitão Reformado do Exército, Henrique Cândido de Araújo Macedo (comissionado como Tenente Coronel), pelo Tenente Coronel Guilherme José do Nascimento, da própria milícia.

Estava derrubada a barreira que impedia o acesso do nosso soldado ao mais alto posto da carreira. Desde então, até os nossos dias, nada mais impede que o mais modesto soldado possa galgar todos os postos da hierarquia militar e chegar a Coronel Comandante Geral da Polícia Militar de São Paulo.



À MARGEM



Estas duas palavras foram, em fins do século passado, o terror dos oficiais da nossa PM. Mesmo depois de proclamada a República, os direitos do oficial eram poucos e mesmo assim, burlados pela expressão tenebrosa... `A Margem.

Ficar o oficial à margem era a perda total de todas as regalias, pois ficaria sem vencimentos e sem uniforme. Excluído!!! À guisa de consolação, o Governo mandava pagar-lhe três meses de vencimentos.

A aplicação da medida era simples. Ao organizar a Lei Orçamentária para cada ano, o Poder Executivo estava já de posse dos nomes dos oficiais que, por qualquer motivo, haviam caído em desgraça. Diminuía, então, uns tantos postos na Lei de organização, atingindo, portanto, aqueles coitados que não eram da “panelinha”, sujeitos às reviravoltas da política ou ao capricho dos poderosos do momento.

Um dos artigos do Regulamento de 1887 estabelecia: “O Presidente da Província poderá demitir o comandante, fiscal, cirurgião e outros oficiais do Corpo Policial Permanente, quando entender que assim o exige o bem do serviço público”.

Em 1892, a Lei n°. 97-A trouxe alguma proteção ao nosso oficial, pois estabelecia que aqueles que tivessem mais de cinco anos de serviço, só perderiam seus postos por sentença condenatória há mais de um ano, ou por mau comportamento provado em Conselho de Disciplina. Esse dispositivo foi revogado em 1896 restabelecido no ano seguinte (Lei n°. 437) e confirmado pela Lei n°. 916-B, de dois de agosto de 1904.

O oficial que ficava, pois, à margem, além de perder os vencimentos e os uniformes, também não podia entrar nos quartéis, havendo casos de o oficial apresentar-se para o serviço e ser surpreendido pela alarmante notícia. Passava então, pelo vexame de ter que se vestir à paisana e sair do quartel sob os olhares da tropa que o via despojado de todos os privilégios. Ia para a rua da amargura!

Esse “À MARGEM” vigorou até 1900 e, já na fixação para 1901, as leis protegiam, como até os dias de hoje, a carreira do oficial e sua estabilidade.

segunda-feira, 16 de março de 2015

O ECLÍPSE DO SOL

Na vida militar, aprendemos que ordens devem ser dadas sempre por escrito. As verbais são proibidas, por que chegam sempre ao destino, a maioria das vezes, completamente deturpadas.

Para enfatizar esse preceito regulamentar, o nosso instrutor, na Academia do Barro Branco dava o seguinte exemplo: 

- O Capitão Comandante da Companhia chamou o 1.º Sargento. e lhe deu a seguinte ordem:

- Amanhã haverá o eclipse do sol. Reúna a Companhia, em frente ao alojamento, que eu vou explicar aos soldados esse fenômeno que acontece periodicamente. Como a aula seguinte é de jogos, todos devem formar com o uniforme de educação física. Se chover, explicarei esse raro fenômeno dentro do alojamento.

- O Primeiro Sargento chama o Terceiro Sargento instrutor e lhe diz:

- Amanhã, o Senhor Capitão vai fazer o eclipse do sol. Se chover, o eclipse será feito dentro do alojamento.

- Do Terceiro Sargento instrutor ao Cabo de dia:

- Amanhã haverá o eclipse do sol no alojamento. O Capitão vai explicar esse fenômeno com o uniforme de educação física.

- Do Cabo de dia ao Soldado:

- Amanhã, haverá o eclipse do Capitão no alojamento, se chover o fenômeno será de uniforme de educação física...

quinta-feira, 5 de março de 2015

DOIS HOMENS ILUSTRES

Na década de 40, a VASP foi recordista em desastres com seus trimotores, na ponte aérea Rio-São Paulo.

Na ocasião era chiquérrimo os noivos passarem a lua de mel na cidade maravilhosa, o Rio de Janeiro, nossa antiga Capital Federal. Eles cumpriam o roteiro obrigatório, durante o dia o banho na praia de Copacabana e as subidas ao Pão de Açúcar e ao Corcovado e à noite o roteiro era outro...

Devido às constantes tragédias, na ida ou na volta, o anedotário popular insinuava aos padres mudarem a frase “até que a morte os separe” para “até que a Vasp os separe”.

Em 1943 uma aeronave vaspeana projetou-se nas águas da Guanabara, morrendo todos, tripulantes e passageiros. Entre os mortos duas figuras ilustres:

O Arcebispo de São Paulo Dom José Gaspar de Afonseca e Silva e o empresário e jornalista Dr. Cásper Líbero. Dom José Gaspar, mineiro de Araxá foi Bispo e Arcebispo de São Paulo. Possuía os cursos Universitário, Filosofia e Teologia, graduando-se também em Direito Canônico em Roma. Foi nomeado Arcebispo em nosso Estado em 29 de julho de 1939, aos 38 anos de idade.

O Dr. Cásper Líbero era natural de Bragança Paulista, grande jornalista. O seu legado é hoje a notável Fundação Cásper Líbero, abrigando o jornal, a rádio e a televisão A Gazeta e a Faculdade que tem o seu nome.

O velório de Dom Gaspar foi na nave da Igreja de Santa Efigênia e do jornalista Cásper Líbero no salão nobre da antiga Gazeta (Rua da Conceição, hoje Rua Cásper Líbero). Os dois velórios, portanto eram próximos, quase vizinhos.

Coube à Força Pública organizar a guarda fúnebre do Arcebispo Dom José Gaspar, em respeito a sua hierarquia eclesiástica. Durante 24 horas os cadetes se revezavam para a honrosa missão, de 15 em 15 minutos, dois à cabeceira e dois aos pés do ilustre morto, carregando seus fuzis com os canos para baixo, em rigorosa posição de sentido, a respiração lenta e reduzido o piscar de olhos, atentos à ronda oficial.

Numa das rendições, um dos cadetes tinha o olho esquerdo com forte grau de estrabismo, causando ao colega de frente um mal estar terrível naquele olho a olho; estava aflito e angustiado, e da angústia veio a explosão, jogou o fuzil e, como um doido, correu pela nave em direção à rua (era madrugada, apenas algumas beatas velavam Dom Gaspar).

Foi energicamente detido e, depois de alguns minutos, já calmo, procurou justificar ao tenente sua falta grave... desculpe-me senhor, eu não resisti olhando aquele olho meio torto, acho que até o senhor no meu lugar não aguentaria... o jovem cadete não pode concluir a frase, porque teve que socorrer seu superior que, curvado e cambaleante, quase apoplético, dava gargalhadas às escâncaras...