A Constituição de 1891, que até então regia os destinos da Nação, foi derrotada, implantando-se um governo discricionário, quando Getúlio Vargas assumiu o poder a 24 de outubro de 1930.
Seus primeiros atos foram substituir os governos dos Estados, nomeando Interventores de sua confiança, influenciado pelo “Clube dos Tenentes”, um grupo militar de “exaltados”, que desde 1922 procurava atingir postos de mando. Apareceram, então, os ex tenentes Juarez Távora, Filinto Muller, Juraci Magalhães nos cenários político-administrativos de Pernambuco, Mato Grosso, Bahia, respectivamente e, em São Paulo, o Interventor João Alberto Lins de Barros.
O General Miguel Costa, acumulando as funções de Secretário da Segurança Pública e Comandante da Força Pública, desentendeu-se com seu subordinado de véspera, o agora Interventor João Alberto, nascendo dentro da Corporação muitos ressentimentos, que culminaram com o movimento denominado Abrilada, a luta de Oficiais dos Batalhões da Capital (a maioria Tenentes) contra o Miguelismo.
Foi o primeiro grito dentro dos nossos quartéis, a 28 de abril de 1931 que, como uma bola de neve, apaixonaria os líderes civis e a opinião pública.
São Paulo exigiu de Getúlio um governo civil e paulista. Na voragem das paixões foi nomeado, o Dr. Plínio Barreto, que não pode assumir o governo, por desentendimento com o General Miguel Costa. Em seu lugar foi nomeado o grande jurista Laudo de Camargo, que em novembro de 1931, não podendo governar, pois as ordens vinham do Catete, não podendo nem mesmo nomear seus Secretários, exonerou-se a pedido.
Tomou as rédeas do governo o general Manoel Rabelo, que continuou a cercear a autonomia bandeirante.
Na tentativa de conciliação, foi nomeado Interventor Federal o Embaixador Pedro de Toledo, mas o estado de coisas permaneceu o mesmo, São Paulo continuando a ser uma terra conquistada.
Em fevereiro de 1932, os partidos políticos se uniram e, inspirados pelo povo, pela mulher integrada na Liga da Defesa Paulista Pró-Constituinte e pelos estudantes de Escolas Superiores, formaram a FRENTE ÚNICA, com a finalidade de exigir a constitucionalização do país, apoiada por políticos de outros Estados, principalmente pelo Rio Grande do Sul, nas pessoas do Governador Flores da Cunha, Borges de Medeiros, Batista Luzardo, Raul Pila, Lindolfo Color, João Neves de Fontoura, e outros. Os políticos de Minas Gerais e o Governador Olegário Maciel também apoiavam São Paulo.
A 21 de maio de 1932, chegou a São Paulo o Dr. Osvaldo Aranha, enviado por Getúlio Vargas, para “resolver o caso paulista”. Em desagravo, a Frente Única lançou um veemente manifesto, no qual convidava o povo para um grande comício, terminando: ”Eia, pois, povo de São Paulo! É chegada a hora de libertação e vitória”. Foi um brado de guerra, a mole humana visitando os Quartéis-Generais do Exército e Força Pública, convidando os militares a solidarizarem-se naquele apelo de liberdade.
Na caminhada histórica, em frente ao Quartel General da Força Pública (Avenida Tiradentes) a Cavalaria Miguelista interveio, ferindo muitos estudantes, aparecendo então a figura impoluta do grande Tribuno Ibrahim Nobre que, inflamado, verberou, na presença do Interventor: já começa a correr o sangue paulista. Estamos algemados, dentro de uma senzala. E V. Ex., Dr. Pedro de Toledo, está preso conosco. V. Ex. deve sair dela e com estes homens vir às ruas reivindicar a nossa liberdade. V.Exª. está no fim da vida e deve escolher: um simples epitáfio ou uma estátua.
A 23 de maio, o entusiasmo chegou ao auge. Pedro de Toledo reconquistou sua autoridade e nomeou o Secretariado de São Paulo. Foi um delírio do povo bandeirante que aclamou o novo Governador e, dando vasão a essa grande conquista, se dirigiu ao centro da cidade para novos arrebatamentos e ao passar pela Praça da República foi “metralhado” por simpatizantes da Ditadura.
Consumou-se então a tragédia, que sensibilizou todas as consciências livres, marcando o calendário cívico da sigla MMDC – Euclides Miragaia, Mario Martins de Miranda, Dráusio Amadeu Martins e Antonio Camargo de Andrade, os estudantes mortos em holocausto a uma grande causa.
O movimento, apaixonando todas as classes sociais, daí por diante, criou uma mística tão forte que evoluiu para um verdadeiro fanatismo cívico, desencadeando a 9 de julho a Revolução Constitucionalista, assumindo o comando geral das tropas os Generais Izidoro Dias Lopes e Bertoldo Klinger.
Os voluntários civis acorreram em massa, formando aproximadamente setenta Batalhões.
Um Corpo de Exército seguiu para o Rio de Janeiro, detendo-se, por grave erro, em Queluz, pois se tivesse avançado até a Capital da República, encontraria o entusiasmo do povo carioca e a guarnição ali sediada não lhes faria resistência, pois o consenso geral reivindicava a democracia para o país.
Foi grandioso e comovente o esforço de guerra dos paulistas, dos brasileiros e estrangeiros aqui residentes, em torno do ideal constitucionalista.
Construíram-se carros de assalto, tanques de guerra e trens blindados.
No parque industrial, fundiram-se matrizes para a produção de capacetes de aço, morteiros, bombardas, bocais para lança-granadas, lança-minas, peças bélicas de reposição, bombas para aviões, granadas de obuses e de mão.
O trabalho da mulher paulista foi notável, respondendo sempre presente, com entusiasmo cívico, em todas as atividades, para que não faltasse aos soldados o fardamento, a alimentação, o tratamento nos hospitais e nas frentes de combate, assistindo também as famílias necessitadas.
Na campanha do ouro, a mulher paulista abdicou de suas jóias de estimação, oferecendo a própria aliança para o bem de São Paulo e do Brasil.
Perfeitamente integradas com os objetivos da Revolução, a Força Pública e Guarda Civil ajudaram São Paulo a escrever a epopéia sem precedentes na História do Brasil, que representou a força da alma livre do bandeirante, lutador indômito em prol de nobres e alevantados ideais.
Obedientes ao governo do Estado, cumpriram, desde a primeira hora, a ordem de mobilização, colocando-se à disposição do comando da Região Militar, a quem coube as operações do Exército Constitucionalista.
A Força Pública, apesar de enfraquecida pelas revoluções anteriores, desfalcada em 1930 de sua artilharia, a aviação e outros apetrechos bélicos, mesmo assim, se rearticulou militarmente e, revigorada, lutou em todos os setores, adestrando também milhares de novos soldados, formando oficiais e graduados de emergências para mais de 70 Batalhões Patrióticos.
Após três meses de luta em todas as frentes, quando os contratempos da guerra impuseram sucessivas retiradas, com munição escassa, ainda assim, sua atuação foi destacada, sustentando cruentos combates, valendo-se muitas vezes da matraca, à guisa de engenho de guerra.
No Monumento Mausoléu de 32 do Ibirapuera dormem os mortos o sono eterno do idealismo paulista. O maior quinhão coube à Força Pública e entre os mártires, o seu Comandante Geral, o bravo General Júlio Marcondes Salgado.
A luta foi heróica. Perdemos a guerra, mas a vencemos moralmente, pois a Constituição chegou em 1934, reabrindo-se o Congresso, as Assembleias Legislativas dos Estados e as Câmaras de Vereadores nos Municípios brasileiros. Em 1937, Getúlio outorgou a Constituinte “Polaca” e governou o Brasil, como Ditador, até 1945. Em 1950, ele foi eleito Presidente da República, mas não soube governar com o Congresso, com o mar de lama embaixo do Catete, com a hostilidade da República do Galeão e com a oratória devastadora de Carlos Lacerda. Suicidou-se em agosto de 1954.
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